sábado, 31 de maio de 2008

Luiza Neto Jorge

MINIBIOGRAFIA

Não me quero com o tempo nem com a moda
Olho como um deus para tudo de alto
Mas zás! do motor corpo o mau ressalto
Me faz a todo o passo errar a coda.

Porque envelheço, adoeço, esqueço
Quanto a vida é gesto e amor é foda;
Diferente me concebo e só do avesso
O formato mulher se me acomoda.

E se a nave vier do fundo espaço
Cedo raptar-me, assassinar-me, cedo:
Logo me leve, subirei sem medo

À cena do mais árduo e do mais escasso.
Um poema deixo, ao retardador:
Meia palavra a bom entendedor.

(Luiza Neto Jorge. In 19 Recantos e Outros Poemas. Antologia Organizada por Jorge Fernandes da Silveira e Mauricio Matos. 7Letras, 2008)
The stars around the lovely moon
Hide their brightness when it is full
And shines the clearest over all
The earth

(Tradução: Josephine Balmer)


As estrelas vestem-na amorosas; a lua
as faz encobertas de seu brilho;
cheia, lua-nua,
mergulha claridade por toda
a terra.

(tradução: oswaldo martins)


As estrelas ao redor
da lua bela
longe o brilho escondem
quando,
plena de fulgor,
mais ela
se entorna
cheia
pela terra.

(tradução: Pedro Alvim)

quinta-feira, 29 de maio de 2008

Apresentação ao blog

Serão treze anos de Estados Unidos em agosto. O acaso que me trouxe aqui, onde não posso deixar de admitir que ampliei minha visão do mundo e do Brasil, não me fez esquecer, nem me isolar, do ambiente literário brasileiro. No momento, ensino literatura brasileira, principalmente, a brasileiros que nem chegaram a conhecê-la bem quando aí viviam. De quebra, os faço compará-la à hispano-americana, na qual me especializei na USP. Está sendo uma bonita experiência: me sinto útil como nunca.

E ainda é do Brasil de onde extraio os temas de minhas narrativas. Com um romance em andamento, voltei a escrever contos curtos, seguindo os ditames de Cortázar, para quem os contos são os poemas da narrativa. Quanto mais curtos, mais a palavra neles, como na poesia, é insubstituível.

A distância me faz participar do Brasil através da mídia internetizada. Leio a Folha e O Globo. Este me permite ver um pouco do que se vê aí na televisão. Tiro uma média do que está sendo discutido e às vezes vem uma idéia, ou uma vontade de tomar parte no debate geral.

Venho visitando o blog do Oswaldo cada vez com mais interesse. Agora também parte dele, envio, como primeira participação, um conto curto (afinal, este é um blog de poetas) que tem essa intenção.

Vertigem

Estávamos as três com o olho grudado na televisão, quando vovó falou:
- Meu Deus, como a Aída Curi está pequeninha...
A narrativa do crime era muito absorvente e ninguém prestou atenção.
- Vai ver que quando caiu lá embaixo, além de virar santa ficou menina outra vez.
- De quem você está falando, vovó?
- Da menina aí da notícia... É a Aída Curi!
Mamãe resolveu responder:
- Não mamãe, o nome dela é outro.
- Ela foi jogada do alto de um edfício, não foi?
- Foi, mas de outro edifício e em outra cidade.
- Copacabana naquela época era fina. A gente andava de tailleur completo e salto alto, não era essa falta de gosto que agora se vê pelas ruas. Em meio à elegância, aquele crime. Você se lembra, Arlete?
- Sim, mamãe, lembro-me muito bem.
- Da Aída Curi? Mas graças a Deus você não a conhecia. Eu não deixava você sair sozinha, tudo era mais decente.
- Lembro-me muito bem, porque você e papai fizeram da minha vida um inferno depois desse crime.
- Pra seu bem, minha filha. Menina de família não acaba como a Aída Curi.
- Isso era no seu tempo, mamãe.
- Ela era uma moça muito bonita, de uma beleza pura. Por isso mesmo se perdeu. E o Ronaldo Guilherme, que a atraiu lá pra cima, e o Cássio Murilo, que a matou! Que pedaços de homem! Olha aí o Ronaldo agora! Pois se estão contando o crime. Olhem bem: não é bonito? Verdade que um pouco caído, sem os óculos rayban, falando errado... Ainda assim, um pão!
- Esse aí tem nome de rei e é o pai da menina que morreu.
- Não foi o pai da Aída Curi que a jogou do alto daquele prédio. Um pai não faz uma coisa dessas. Isso é absurdo. Se é pai, tem que proteger a filha. Quem matou a Aída Curi foi o namorado dela, ou o homem que ela pensava que era namorado dela.
- Isso era no seu tempo, mamãe! E nem o Ronaldo, nem o Cássio Murilo eram namorados da Aída Curi.
- Tinha um outro envolvido também. Um outro cafajeste, como a gente chamava os meninos desajustados naquele tempo. Imagina, currada por dois homens, que horror. Isso é que dá aceitar convites sem pensar, se deixar seduzir pela beleza, pelas belas palavras... Olha só a carinha da menina. É a Aída Curi quando era menina, tenho certeza.
- Hora de ir pra cama! Você está confundindo tudo, mamãe!
- Se eu for pra cama agora, vou sonhar com o Ronaldo Guilherme.
- Pois deveria ter um pesadelo com o Ronaldo. E com o Cássio Murilo também. Foram eles os responsáveis por você e papai me obrigarem a esquecer minha turma da praia, vigiando-me como uma retardada. Terminei casada com o estafermo do Gregório.
- Puxa, mãe, como você pode falar assim do papai, além do mais, já morto?
- Você não se casou com ele, Patrícia, nem chegou a conviver com ele como seus irmãos, muito mais velhos que você, tiveram que fazer a contragosto.
- Eu também acho que você não pode reclamar, Arlete. O Gregório era um bom partido. Graças a ele, você vive nesse apartamento de frente pro mar. Em Copacabana.
- Decadente, mamãe. O apartamento e o bairro.
- O problema foi Gregório ter morrido tão cedo. Trabalhava muito. Muita preocupação financeira...
- Falcatruas, mamãe, sempre metido em falcatruas. Só me deixou dívidas.
Vovó esqueceu-se da televisão e perdeu os olhos em algum ponto distante do oceano Atlântico, muito além da janela do apartamento.
- Eu nunca confessei a ninguém, mas eu me apaixonei pelo Ronaldo Guilherme. O Cássio Murilo era um fedelho, não oferecia atrativo para a mulher madura que eu era na época. Já o Ronaldo lembrava o Marlon Brando. Eu amei o Ronaldo Guilherme...
- Como, mamãe?
- Era uma paixão medonha. Eu o imaginava me dizendo obscenidades no ouvido, me rasgando a roupa... Assim descreveram o crime: rasgaram a roupa da moça e ela lutou. Dizem que se jogou lá de cima para salvar-se deles, tendo morrido virgem. Boba. Eu mais queria era fazer sexo com o Ronaldo Guilherme, até com o Cássio Murilo...
- Mamãe, você está ficando inconveniente. Hora de ir pra cama!
- E eu vou perder o Ronaldo falando na televisão? Quem é a namorada dele?
- Não é namorada. É a mulher dele.
- Ele casou? Que pena! Não há mais esperança de que eu me case com o Ronaldo Guilherme? Na verdade não parece o Ronaldo, sempre bem vestido, bem articulado...
- Mamãe, eu já disse à senhora que esse não é o Ronaldo.
- E essa mulher, quem é?
- É a mulher do rapaz. A polícia diz que ela estrangulou a enteada e o pai da menina a jogou pela janela.
- Meu Deus! Ronaldo não faria uma coisa dessas.
- Como não?
- Ora, Arlete! Tem muita diferença entre jogar pela janela uma desconhecida, que além disso concordou em subir com ele para o apartamento, e assassinar a própria filha.
- E qual é a diferença?
- A dos tempos, minha filha. Antes, a gente protegia as filhas, vigiava a companhia delas, punha atenção à hora em que chegavam em casa, agora é esse caos, essa falta de hábitos.
- Espera aí, vovó, não vira sua metralhadora giratória contra mim, não!, tive que me defender, já que conhecia onde esse comentário terminava.
- Mas se a menina estava na casa da família dela, mamãe!
- Que família? Se era enteada da tal que dizem que a esganou, onde estava a mãe dela? Assim que esse pão aí, além de assassino, é bígamo?
- Chega, mamãe. Dessa vez você vai pra cama sem apelação.
Apesar da má vontade, vovó concordou. Já cansada de tanto alarde, desliguei a televisão. Depois de acomodar a vovó, mamãe voltou à sala. Acendeu um cigarro (por que não pára de fumar?) e sentou-se a meu lado. As duas contemplávamos o navio iluminado que cortava o oceano.
- Mãe, a quem se referia a vovó? Quem era Aída Curi?
- A vítima do crime mais comentado dos anos 50. Moça pobre, estudante de datilografia. Acho que não era de Copacabana. Se era, não freqüentava o círculo dos seus assassinos.
- Quem eram eles?

- Meninos de famílias importantes. Passavam seu tempo entre a praia e as motocicletas da época de James Dean, do Marlon Brando jovem..
- Marlon Brando sei quem era, mas James Dean...
- Um ídolo do cinema americano. Os rapazes o imitavam, com seu casaco de couro, seus óculos rayban...
- Você conhecia essa turma, mamãe?
- Não exatamente. Eu era quase uma menina. Davam medo, mas também fascinavam. Os homens, especialmente. No final das contas, se comportavam todos igualzinho a eles.
A fumaça do cigarro escondia os olhos úmidos de mamãe.
- O que foi, mãe? Más lembranças?
- Talvez, filha.
- O crime foi aqui em Copacabana?
- Sim, aqui pertinho, na Atlântica mesmo. Acho que o prédio ainda existe. Jogaram a moça do 12º. andar.
- Isso está parecendo o caso daquela menina lá da Fonte da Saudade, uma tal de Mônica. Tinha uns quinze anos. Também foi jogada de um andar alto, por dois rapazes que a conheceram numa discoteca. Eu era garota ainda, mas lembro do escândalo.
- É um crime da sua geração. Não ficou registrado na minha memória.
- Acode, gente! O Ronaldo Guilherme e o Cássio Murilo querem me estuprar!
Mamãe de um salto alcançou o quarto e conseguiu segurar a roupa da vovó. Seu corpo delgado obedeceu e recuou. Eu a abracei pela cintura, protegendo-a contra a janela, o que me fez projetar meu próprio corpo quase metade para fora, mas as mãos de mamãe se fecharam nas minhas costas, puxando à mim e à vovó para trás. Ficamos as três abraçadas, trêmulas de medo, a contemplar as ondas de pedra, brancas e negras, no calçadão lá embaixo, enquanto na Avenida Atlântica, como nos cartões postais, os carros deixavam, na sua passagem, um rastro de luz.

(Lídia Santos)

A mendiga de Cristo

Está lá no TextoTerritório a gravação da Mendiga de Cristo. Confiram.

quarta-feira, 28 de maio de 2008

ARVIM, ARGOERA OU ALGO ASSIM

ARVIM, ARGOERA OU ALGO ASSIM

Para Marlene

não há nada mais agreste do que a pitanga
e não há nada mais contrário à pitanga do que seu nome: pitanga

pitanga poderia ser arvim, argoera, ou coisa assim, onde o agreste se fizesse presente

mas porque o seu nome a inviabilizou para a poesia registro o fato
de que poeta algum irá conspurcá-la em verso

desejo que não se enuncia porque não se define
a pitanga destila o seu antídoto e se preserva para o gosto
apenas

De Sobre a Carne do Poema, In: 360º. Poesia Reunida, p. 73 e p. 79.

Anotações sobre as cores - Fragmentos

35. Lichtenberg sagt, nur wenige Menschen hätten je reines WeiB gesehen. So verwenden also die Meisten das Wort falsch? Und wie hat er den richtigen Gebrauch gelernt? —Vielmehr: er hat aus dem tatsächlichen einen Idealgebrauch konstruiert. Wie man eine Geometrie konstruiert. Aber mit "Ideal" ist hier nicht etwas besonders Gutes, sondem nur etwas auf die Spitze getriebenes gemeint.”
36. Und freilich kann só ein erfundener uns wieder über den wirklichen Gebrauch belehren.
Und es könnte auch sein, daB wir, z.B. für wissenschaftliche Zwecke, einen neuen Begrifl des 'reinen WeiB' einführen. (Ein solcher neuer Begriff entspräche dann etwa dem chemischen Begrifí eines 'Salzes').


35. Lichtenberg diz que muito poucos homens teriam visto alguma vez o branco puro. Nesse caso, usará a maioria a palavra de uma forma errada? — E como aprendeu ele o uso correcto? Pelo con­trário: Ele construiu um uso ideal a partir do uso executivo. Tal como construímos uma geometria. E "ideal" não significa aqui uma coisa especialmente boa, mas apenas algo que foi levado aos extre­mos.
36. E, certamente, uma tal construção pode, por sua vez, ensinar--nos algo sobre a sua utilização efectiva.
E poderíamos também introduzir um novo conceito de "branco puro", para fins científicos, por exemplo (um novo conceito assim corresponderia, digamos, ao conceito químico de "sal").

(Ludiwig Wittgenstein Tradução: Filipe Nogueira e Maria João Freitas)

Ariadne's Lament

Who will warm me, who loves me still?
Give warm hands!
Give the heart's brazier!
Prone, shuddering
Like one half dead, whose feet are warmed;
Shaken, alas! by unknown fevers,
Trembling at pointed arrows of glacial frost,
Hunted by you, Thought!
Nameless! Cloaked! Horrid!
You hunter behind clouds!
Struck down by your lightning,
Your scornful eye, glaring at me out of the dark!
Thus I lie,
Writhing, twisted, tormented
By all the eternal afflictions,
Struck
By you, cruelest hunter,
You unknown—god ...

Strike deeper!
Strike one more time!
Stab, break this heart!
Why all this affliction
With blunt-toothed arrows?
How can you gaze evermore,
Unweary of human agony,
With the spiteful lightning eyes of gods?
You do not wish to kill,
Only to torment, torment?
Why torment—me,
You spiteful unknown god?

Aha!
You creep closer
Around midnight? ...
What do you want?
Speak!
You push me, press upon me,
Ah, already much too close!
You hear me breathing,
You eavesdrop on my heart,
Most jealous one! —
What are you jealous of anyway?
Away! Away!
What's the ladder for?
Do you want inside,
Would you get into my heart,
And enter
My most secret thoughts?
Shameless one! Unknown! Thief!
What do you wish to steal for yourself?
What do you wish to hear for yourself?
What will you gain by torture,
You torturer!
You—executioner-god!
Or am I, like a dog,
To wallow before you?
Devoted, eager due to my
Love for you—fawning over you?
In vain!
It stabs again!
Cruelest sting!
I am not your dog, only your prey,
Cruelest hunter!
Your proudest prisoner,
You robber behind clouds ...
Speak finally!
You, cloaked by lightning! Unknown! Speak!
What do you want, highwayman, from—me?...

What?
A ransom?
What do you want for ransom?
Demand much—so advises my pride!
And talk little—my pride advises as well!

Aha!
Me?—you want me?
Me—all of me? ...

Aha!
And tormenting me, fool that you are,
You wrack my pride?
Give me love—who warms me still?
Who loves me still?
Give warm hands,
Give the heart's brazier,
Give me, the loneliest one,
Ice, alas! whom ice sevenfold
Has taught to yearn for enemies,
Even for my enemies
Give, yes, surrender to me,
Cruelest enemy —
Yourself! ...

Gone!
He has fled,
My only companion,
My splendid enemy,
My unknown,
My executioner-god! ...
No!
Come back!
With all your afflictions!
All my tears gush forth
To you they stream
And the last flames of my heart
Glow for you.
Oh, come back,
My unknown god! my pain!
My ultimate happiness! ...

A lightening bolt. Dionysus becomes visible in emerald beauty.

Dionysus:

Be clever, Ariadne! ...
You have little ears; you have my ears:
Put a clever word in them! —
Must one not first hate oneself, in order to love oneself? ...
I am your labyrinth ...



F. Nietzsche. Poema do "Ditirambo de Dionísio". 1892. Tradução do Nietzsche Channel.

terça-feira, 27 de maio de 2008

Roberto Bolaño

Roberto Bolaño é uma leitura obrigatória. Seu romance A pista de gelo é denso, inovador. Através de uma costura sutil entre os personagens ao longo da narrativa, vai bordando uma ensinança do escrever; sem descuidar do fio tenso que guia o leitor, mais se esforça para dele esconder do que revelar a trama. É sobretudo um livro de literatura, para a literatura e para os escritores de literatura. Dói lê-lo, como dói ler O Coetzee. Como doeu ter lido Dostoiewisk e Machado.
Mas a dor de quem lê não é a dor fadada à emoção profunda é como uma música que se ouve pensando em qual será a surpresa suscitada pelo levar da orquestra, pelas invenções do compositor. Ler com dor é perceber a construção radical de um mundo que se nos impõe, que nos força a acreditar no que está escrito. Na partitura. Como na poesia de Trakl tudo é novo; o mundo outro.

(Oswaldo Martins)

segunda-feira, 26 de maio de 2008

Lindo, tórrido...

Entro numa virtualidade sem fim, chego a um poema...
Oswaldo, com a Cosmologia do Impreciso...
É como se pudesse me tocar cá em Minas...
Sinto-me a própria mendiga...
Escorre gozo por entre as pernas...
Onde tece sua poesia?
Em que recantos, desvãos?
Quantas Madalenas mais tecerás para que as encontre, eu mesma, todas em mim?
Lindo poema... Mineiro.



"a mendiga de cristo

uma madalena com os seus vícios
sem pregas e agradecimento uma
a nos pedir mais mais e mais ressuma
o gozo que dos pés até o fictício

céu das bocas grita por nomes crus
uma, ofegante de prazer nos corpos
túrgidos, a que se deitasse nua
sobre o deserto e – cega de calor –

mais nas coxas firmes na racha a sede
de eternidade rogasse, a que contra
a morte se insurgisse, a que seus pares

com as pernas abertas para o flerte
convocasse à comunhão dos bares
e, como sempre, estivesse pronta "

A Sort of a Song

Let the snake wait under
his weed
and the writing
be of words, slow and quick, sharp
to strike, quiet to wait,
sleepless.

- through metaphor to reconcile
the people and the stones.
Compose. (No ideas
but in things) Invent!
Saxifrage is my flower that splits
the rocks.

William Carlos Williams, in "The Wedge", 1944

domingo, 25 de maio de 2008

Vilegiatura - Paulo Henriques Brito

Enviou este belíssimo poema a Célia Pedrosa.

VILEGIATURA

Munidos de maçãs, lápis e fósforos,
conquistaremos Nínive amanhã,
se não der praia e a noite for de sono.
Porque afinal os dias são dourados
e tudo é matinal nessa estação
de água fresca, madrigais e cópulas.

São tantas mãos e bocas, tantas cópulas,
tantas razões de se riscar um fósforo,
é tão horizontal essa estação,
que é puro engodo a idéia do amanhã.
E por que não beber o sol dourado
enquanto não nos sobrevém o sono?

Idéias sussurradas pelo sono,
pela sofreguidão de muitas cópulas.
Enquanto isso, Nínive dourada
aguarda a combustão de nossos fósforos
ao primeiro suspiro da manhã.
Rechacemos o torpor da estação

(e como é modorrenta essa estação.
tempo de bandolim, maçãs e sono!)
e vamos nus, na bruma da manhã,
buscar a glória, traduzida em cópulas,
claustros, tributos, castiçais e fósforos,
caixas de música e ídolos dourados.

Tomaremos a cidade dourada
na hora derradeira da estação,
quando já não restar nem mais um fósforo,
uma gota de sol, de céu, de sono.
A entrada triunfal será uma cópula
na imensidão da última manhã.

Quando acordarmos, já será amanhã,
os olhos turvos de sonhos dourados,
as peles mornas recendendo a cópulas,
bagagens esquecidas na estação,
jornais, explicações, ressaca e sono,
um alvoroço de café e fósforos.

Os fósforos primeiros da manhã
riscam o sono e o sonho do Eldorado.
Dessa estação só vão restar as cópulas.

(Trovar claro, 1997 Paulo Henriques Brito)

sábado, 24 de maio de 2008

Orelha do Cosmologia

Viver não é preciso. A poesia de Oswaldo Martins porta esse lema dos antigos argonautas por princípio. A partir daí o poeta provoca a percepção dessa imprecisa (e humana) condição, através de mapas afetivos e mordazes, poemas-instrumentos para a navegação do leitor em meio aos valores culturais e morais da herança ocidental, versos com a precisão digna dos cosmonautas de hoje, pois navegar é preciso.

Mas há que se compreender a natureza da precisão nesse intenso e sofisticado trabalho. O poeta recusa, também por princípio, certa tendência mais formalizante, que costuma associar a precisão e a contenção do verso ao ascetismo da poesia. Na mão de incautos, poesia acaba sendo “verso, noves fora zero”. E a vida, mote-mor do humano, e por extensão da poesia, fica menor. Contra isso, mas sem cair no panfleto nem no prosaísmo, prezando o melhor da condensação poética e o mais vital da existência, como um admirador confesso de Bandeira, Oswaldo Martins é provocador com seus poemas.

Desde seu primeiro livro, desestudos, e reafirmado no segundo, minimalhas do alheio, o intenso jogo dialógico é motor para a poesia de Oswaldo Martins. É um desafio para o leitor desfiar os intertextos que cada poema instaura, não só com a literatura, mas também com a pintura, o cinema, a música, e toda forma de arte. E isso sem hierarquizar o erudito ou o popular, o nacional ou o estrangeiro. O que coloca o poeta num lugar ideologicamente privilegiado e intelectualmente livre.

Liberdade fundamental, pois, para além desse vasto diálogo com a cultura, o poeta vem também insuflando a inquietação dos metafísicos. Desde lucidez do oco, seu terceiro livro, a aporia que cinde o humano em corpo e espírito (seja o santo ou o das luzes), é combatida em nome liberdade e da afirmação irrefutável da vida. Agora, cosmologia do impreciso consagra e define a cosmovisão da poesia de Oswaldo Martins. A vida e a liberdade (como condição inevitável do homem, para lembrarmos Sartre), são reafirmadas através do erótico, em sua fortuidade mais (ex-/im-)pulsiva: a buceta, sintomaticamente grafada com u, ratificando o gesto transgressor, a sedição da poesia. “Dobradura-porta/aberta ao absurdo”, como diz o a “antimetafísica das apreciações”, é a buceta, mas também são os quadros e livros que “buscam/o que de buceta/são”. A imagem funda um jogo complexo em que as idéias de nascer e gozar, entrar e sair, circulam, do livro para a vida, da vida para o livro. Entre por ali, então, o leitor: pela constatação de que é entre os corpos que a vida se consuma, e que a utopia da poesia, da arte, enfim, é menos alimentar o espírito que tocar esse impreciso viver.

(Alexandre Faria)

sábado, 17 de maio de 2008

pensando na redondilha

naveguei sem ver estrelas
sem tratar de tordesilhas

trouxe no olhar a cegueira
nervos movidos a pilha

cada perda cada queda
era uma nova bastilha

fui o lobo solitário
que abandonou a matilha

fechei corpo vendi alma
o coração – uma ilha

me analfabetizei
desinventei a cartilha

acabei poeta do bairro
escritor da família

acima do peso dos anos
comedor de redondilha

Cesar Cardoso

sexta-feira, 16 de maio de 2008

3. XIBALBA

Sala I

No centro da sala
umbanco de ferro
bem aquecido:
no chão, ao redor,
bonecas e bonecos grandes
com o traseiro e
coxas danificados,
consumidos pelo calors
abrasivo.


Sala II

No centro da sala gêmeos
idênticos - sem lábios;
seus dentes, expostos, batem
sem parar: frio, ódio,
ou descontrole?
Não dão um passo -
para lugar nenhum.

(Sérgio Medeiros - TÓTEM & SACRIFÍCIO)

quarta-feira, 14 de maio de 2008

9

o sax
de tanto que chora

cria o descompasso
o disfarce da música

a celebração da beleza

ANTES DA NOITE

Era uma cidadinha próxima da capital federal, o Rio de Janeiro dos anos 50. Uma tecelagem pequena movi-a a cascata vertida de montanhas que emprestavam seu verde a dois campos de futebol.
O menino tinha uns quatro anos. Dois casais eram sua família - pais e irmãos muito mais velhos.
Uma tarde, desligado o altofalante depois da avemaria, ele viu e chamou ao quintal a família que também viu. No céu do crepúsculo, uma luz estelar semovente riscava o azul quase escuro, rápido como se fosse movimento de reflexo de sol num espelhino.
Periódicos de lugarejos que viram teriam noticiado um pouco no dia seguinte, disseram os mais velhos. O menino ainda não lia.
Os pais deixaram de confirmar a visão antes que o menino completasse os dez anos. Os irmãos fingiram esquecer aquilo, mal cresceram e freqüentaram a metrópole.
O menino também cresceu na capital, tornou-se adulto e viajou pelo mundo. Mas com freqüência vê a luz que se move entre arranha-céus ou serranias, por entre boeings ou no horizonte que separa o mar do céu antes da noite.

Cláudio Correia Leitão

Cosmologia do Impreciso

6
lecuona

suas vísceras me vestem

na calçada fria
chove

talvez
a cidade deslize

aquém de todo trânsito
de toda busca

o beijo como a música
compõe sobre o corpo

do amor

(oswaldo martins - cosmologia do impreciso)

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Konstantinos Kaváfis

2

Sinto em mim uma extraordinária capacidade. Tenho a certeza de que, se quisesse, poderia tornar-me um grande médico, advogado, economista ou engenheiro. Bastariam apenas duas coisas: tempo para estudar e vontade de abandonar a literatura. Será uma ilusão do espírito? Estarei sobrestimenando minha capacidade? Ou é algo natural em todo littérateur - isto é, uma aptidão de que todo littérateur é dotado? Parecem-me fáceis todas as atividades práticas. A despeito de toda a minha certeza, reconheço porém que se não dispusesse de tempo, de tempo sufuciente, eu não seria verdadeiramente capaz de ter sucesso na vida prática. Mas nesse caso eu cairia na categoria geral: com tempo bastante ao seu dispor, qualquer homem de dotes intelectuais medianos sair-se-ia bem. Não: o que me torna superior é o sentimento de que eu precisaria de muito menos tempo. Isso não me impede de reconhecer que eu nunca poderia ter êxito na vida prática, porque acho impossível - salvo por um esforço que aquase me dilaceraria a alma, - arrancar de mim o hamkering pela literatura. E eis que me vem outro pensamento. Talvez essa mesma capacidade que me fez ver como fáceis as profissões práticas, resulte de literatura, do contínuo pensar, do sharpening da imaginação, Se me fosse dado renegar a imaginação sem sofrimento, talvez então eu perdesse as energias e profissões práticas se me afigurassem tão difíceis como para o comum das pessoas. Mas não creio nisto. A capacidade existe. Minha fraqueza - ou minha força, na suposição de que o trabalho artístico tenha valor, - está em eu não poder abdicar da literatura, ou melhor, da voluptuosa agitation da imaginação.

( Kaváfis - Reflexões sobre poesia e ética - trad. José Paulo Paes)

sábado, 10 de maio de 2008

IMPRESSÕES DIGITAIS nº 1

JORNAL LITERÁRIO: ISSO EXISTE ?


Existe sim! É o Rascunho, jornal mensal editado em Curitiba. São 4 cadernos com cerca de 16 páginas discutindo e publicando literatura do Brasil e do mundo. Polêmica à vontade, sempre o depoimento de um escritor sobre seu trabalho e sua trajetória , um visual bem transado e muita prosa, poesia e ensaio, com 8 anos de existência e resistência. Entre a turma que costuma estar todo mês lá, Flávio Carneiro, José Castello, Milton Hatoum e Nelson de Oliveira. Quem quiser pode ler, quem quiser pode mandar colaboração. Eles aceitam e publicam, dentro dos critérios editoriais.
Pra conhecer mais (e vale e pena!): http://rascunho.rpc.com.br/

UM BAMBA

Os amigos e parceiros na mesa do bar, como Paulo Cesar Pinheiro, sempre se lembram do Bolacha. O samba agora pode se lembrar um pouco mais dele: Mauro Duarte. Graças ao cd duplo “O samba Informal de Mauro Duarte”, gravado por Cristina Buarque e o grupo Samba de Fato, a obra desse mestre pode ser mais recordada e divulgada. Mauro Duarte morreu aos 59 anos, em 1989, deixando parcerias com Elton Medeiros, Noca da Portela, Mauricio Tapajós, Dona Yvonne Lara, entre outros. É um dos bambas. É só conferir.

PERDER TEMPO É DINHEIRO!

Numa época de holdings editoriais e super-hiper-mega-stores de literatura, sempre é bom lembrar o prazer de entrar num sebo e perder uma manhã lá dentro à procura de um livro que nem sabemos qual é. E talvez nem encontremos.
Pra quem vive no Rio, o Guia Comentado dos Sebos da Cidade do Rio de Janeiro, de Antonio Carlos Secchin, é um prato cheio e ainda tem edições atualizadas de tempos em tempos. Para as outras cidades vale a pena alguém se aventurar num mapeamento semelhante.
Livro não tem que ser novo e pode ser um presente baratíssimo, dado a qualquer hora e dia, sem necessidade de data importante. Não acham?

ABRAM AS GAVETAS


Alguns concursos acontecem neste mês de maio. Pra quem tem texto na gaveta, a hora é essa!
Prêmios Literários Cidade de Manaus – nas categorias romance, novela, conto, poesia, crônica ensaio, entre outros gêneros. Inscrições até 31 de maio. Para mais informações: Conselho Municipal de Cultura, Rua Jutaí, 37, Quadra 35, Vieiralves, Manaus. CEP 69.053-020 e telefone: (92) 3584-3912.
Prêmio Off Flip De Literatura 2008 – nas categorias poesia e conto. Inscrições até 21 de maio e contato em: offflip@paraty.com .
Prêmio SESC de Literatura 2008 – nas categorias conto e romance. Para informações, edital e inscrições vá ao site http://www.sesc.com.br/ e procure na página de abertura “Prêmio SESC de Literatura 2008”.
O Estadão e a Bossa Nova – o jornal Estado de São Paulo lança concurso de contos com o tema “Não Quero Mais Esse Negócio de Você Longe de Mim”. Inscrições até 31 de maio e maiores informações em www.estadao.com.br/arteelazer .

FLA X FLUS DA LITERATURA

O Burak, o Manticora, a Youwarkee, o Kraken.
Quem serão esses? Você descobrirá nas páginas de “O Livro dos Seres Imaginários”, de Jorge Luis Borges e Marguerita Guerrero. Juntos eles coletaram 116 monstros ou seres imaginários, como diz o título, pesquisando mitologias, religiões e obras literárias e criando uma fauna literalmente fantástica (segundo Houaiss, “aquilo que só existe na imaginação, na fantasia”). É uma pequena enciclopédia da quimera humana, escrita por quem gostava tanto de enciclopédias. Um clássico, um Fla x Flu da literatura.

DICA ON LINE

Cronópios. Os seres inventados por Cortazar vieram batizar este site de literatura que vale a pena conhecer e receber via e mail. Cronópios publica literatura e ensaios, discute cultura e arte e conta com uma equipe de articulistas grande e de qualidade, com gente como Braulio Tavares, Ítalo Moriconi, Marcelino Freire, Sergio Sant’Anna, Glauco Mattoso, Sebastião Nunes e mais uma dezena de craques. O site ainda tem a revista de poesia MnemoZine, a sessão infantil Cronopinhos, a Tv Cronópios, os pockets e-books e mais e mais e mais... Só indo lá pra conhecer e virar freguês. Ou até colaborador: http://www.cronopios.com.br/ .
As IMPRESSÕES DIGITAIS são uma criação de Cesar Cardoso

quarta-feira, 7 de maio de 2008

SE (Para uma leitura do Cosmologia)

Esperai, meu amigo: pode ser que aquilo que se segue dará alguma verossimilhança a ideias que não vos divertiram até agora a não ser como um sonho agradável, como um sistema engenhoso. Se nossa religião não fosse uma triste e lhana metafísica; se nossos pintores e nossos estatuários fossem homens comparáveis aos pintores e aos estatuários antigos (quero dizer, os bons; pois provavelmente contaram também com maus, e mais do que nós, assim como a Itália é o lugar onde se faz a melhor e a pior música); se nossos padres não fossem estúpidos carolas; se este abominável cristianismo não se tivesse estabelecido pelo assassínio e pelo sangue; se as alegrias de nosso paraíso não se reduzissem a uma impertinente visão beatífica de não sei o quê, que não se compreende nem entende; se o nosso inferno oferecesse outra coisa além dos abismos de fogo, dos demónios hediondos e góticos, dos uivos e rangidos de dentes; se nossos quadros pudessem ser outra coisa afora cenas de atrocidades, um esfolado, um enforcado, um assado, um grelhado, uma asquerosa carnificina; se to­dos os nossos santos e as nossas santas não estivessem velados até a ponta do nariz, se as nossas ideias de pudor e de modéstia não houves­sem proscrito a vista de braços, pernas, tetas, espáduas, toda nudez; se o espírito das mortificações não tivesse murchado essas tetas, amoleci­do essas coxas, descarnado esses braços, dilacerado essas espáduas; se nossos artistas não estivessem encadeados e nossos poetas contidos pelas palavras pavorosas de sacrilégio e de profanação; se a Virgem Maria tivesse sido a mãe do prazer, ou então, mãe de Deus, se tivessem sido seus belos olhos, seu belos seios, suas belas coxas, que houves­sem atraído o Espírito Santo sobre ela, e se isto estivesse escrito no livro de sua história; se o anjo Gabriel fosse aí louvado por suas belas espáduas; se Madalena tivesse tido alguma aventura galante com Cris­to, se, nas bodas de Caná, Cristo, entre dois vinhos, um pouco inconformista, houvesse percorrido o colo de uma das moças das bo­das e as coxas de São João, incerto se permaneceria fiel ou não ao apóstolo de queixo sombreado com ligeira penugem: veríeis o que acon­teceria com nossos pintores, com nossos poetas e com nossos estatuários; com que tom falaríamos de seus encantos, que desempenhariam um papel tão grande e tão maravilhoso na história de nossa religião e de nosso Deus; e com que olhos miraríamos a beleza à qual deveríamos o nascimento, a encarnação do Salvador e a graça de nossa redenção.

(Denis Diderot – Ensaio sobre a pintura)

terça-feira, 6 de maio de 2008

epígrafe do Cosmologia do Impreciso

a boca é vinho tinto
as mãos são de absinto
e a cintura dela é a estrela por nascer

(odalisca - aldir blanc para música de guinga)

segunda-feira, 5 de maio de 2008

sexta-feira, 2 de maio de 2008

Causa y Efecto

essa mulher.

negra
olhos tristes

o emaranhado
de fractais

totem
de uma áfrica

desarvorada
paisagem

(oswaldo martins)

Murilo Mendes

Juan Gris

Espanha, mestra do espaço,
Deu a pureza, medida
Na área total da pintura
Com o Gênio da concisão,
Pelo pincel de Juan Gris.

Nessa pentura pensada
com clareza dialética,
Espanha, dita "irracional",
Pelos planos de Juan Gris
Mostra o acordo e simetria.

(Murilo Mendes - Tempo Espanhol)

Juan Gris


ONDJAKI

O mundo tinha aquele cheiro de terra depois de chover e também o terrível cheiro das despedidas. Não gosto de despedidas porque elas têm esse cheiro de amizades que se transformam em recordações molhadas com bué de lágrimas. Não gosto de despedidas porque elas chegam dentro de mim como se fossem mujimbeiros que dizem segredos do futuro que eu nunca pedi a ninguém para vir soprar no meu ouvido de criança.
Desci. Sentei-me perto, muito perto da avó Agnette.
Ficámos a olhar o verde do jardim, as gotas a evaporarem, as lesmas a prepararem os corpos para novas caminhadas. O recomeçar das coisas.
__Não sei onde é que as lesmas sempre vão, avó.
__Vão pra casa, filho.
__Tantas vezes de um lado para o outro?
__ Uma casa está em muitos lugares - ela respirou devagar, me abraçou. __ É uma coisa que se encontra.

(ondjaki - palavras para o velho abacateiro in os da minha rua - Língua Geral Editora)


quinta-feira, 1 de maio de 2008

Poema do dia

entrevista

nasci em Atenas, fiz o pré-primário
ouvindo as louçanias de Platão;
fiz piqueniques com Nabucodonosor;
antes, Homero me deixou a ver navios,
éramos gêmeos, Odisseu e eu;
as musas me escolheram por intérprete,
mas não esplandecem mais no meu Parnaso;
o Rio de Jnaeiro é meu exílio;
embora cortejado como príncipe,
quisera me instalar noutras Arcádias;
meus amores não moram neste mundo
só quero embriagar-me com o absinto
da eternidade
no penthouse da minha torre de marfim.

(Geraldo Carneiro - balada do impostor)

A NOSSA MORANGUÍSSIMA PAIXÃO

seria algo assim
como matar & desmatar o tocatins
com a clave dos dentes duendes tocar
o sax do céu

em ves disso essas palavras
q não saem do papel

(Cesar Cardoso)