quinta-feira, 26 de agosto de 2010

desimitação de dalton trevisan

1
umas quebram nas passarelas
outras nos bailes funk

as que passarelam
se desbundam

as dos bailes funk
abundam

umas giselam bunchen
outras dançam lumas

2

as bocas verticais
a chaleirinha

ó pai
das desgracidas

são voragens
que se negam

às imitações
das burguesinhas

3

diante do espelho
de pé

entre as nalgas
os dedos nos biquinhos

a língua porca
da língua portuguesa


(oswaldo martins)

terça-feira, 17 de agosto de 2010

Frasezinha 3

O que interessa, na vida e na literatura, é o coração deflorado do homem.

(Dalton Trevisan - Desgracida - Em carta para Otto Lara Resende)

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

LOUVAÇÃO 1

O amor às tuas prendas
- ó bunda bundinha bundona -
afina o som brejeiro da Trinca do Chorinho
move o relógio de flores da praça da Feirinha!

(Dalton Trevisan - Desgracida)

O VARREDOR

Entra ano
sai ano
e eu?
varrendo sempre
as mesmas folhas secas
das mesmas velhas árvores
nesta mesma cidade fantasma!

(Dalton Trevisan - Desgracida)

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Poema do dia

Síntese

Noite silenciosa. Casa silenciosa.
Mas sou a mais calma estrela,
Eu também produzo luz própria
Além dos limites de minha noite.

Cerebralmente, voltei para casa
De infernos, céus, lixo e gado
E também o que se concede à mulher
É obscura e doce masturbação.

Revolvo o mundo. Agonizo a pressa.
E depois me dispo na alegria:
Não há morte, nem pó malcheiroso
Que me leve, eu-conceito, de volta ao mundo.

(Gottgried Benn)

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

esta casa

para organizar o mundo

coloquei uma cadeira na sala

na cozinha os pratos

na mesinha os pés

descobertos



chega de mapas

caminhada

chega de jornada.

(Lúcia Leão)

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Pilulinha 14

PORTEIRA, o site de Elomar Figueira Mello, é uma dessas pequenas jóias que, às vezes, aparecem. Uma correspondência quase mágica faz com que o ambiente de suas músicas, algo perdido pelo mundo Brasil, seja transportado para o maravilhoso que cada um de nós temos guardado no fundo mítico de nós mesmos. Um certo estar que foi se perdendo, se desfazendo em favor das correrias das cidades. Visitar o Porteira é penetrar na noite sem fim de nossos sonhos, nos arquétipos mais densos de nossos desejos. Além de poder ouvir, sem pirataria, a voz e o violão estonteante do intérprete e compositor sem par da música brasileira.

(oswaldo martins)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

CRISTINA BUARQUE CANTA WILSON BATISTA


Pilulinha 13

Ganha-se pouco, mas é divertido foi gravado por Cristina Buarque, num registro de arrepiar. A picardia da letra é apreveitada soberbamente pela cantora. Neste samba, que dá título à coletânea gravada, a presença da voz feminina, entre a reclamação à glorificação do sambista, protótipo do malandro, talvez constitua um dos pontos altos da obra de Wilson Batista. O disco gravado por Cristina traz ainda alguns versos que são pérolas da música brasileira, sempre pontuados por esta voz nascida para cantar samba. Uma pequena pílula:

És uma perfeita artista, eu sei bem,
Também fui do trapézio,
Até salto mortal
No arame eu já dei.

GANHA_SE POUCA MAS É DIVERTIDO

Ganha-se pouco, mas é divertido
(Wilson Batista)


Ele trabalha de segunda a sábado
Com muito gosto sem reclamar
Mas no domingo ele tira o macacão,
E manda no barracão,
põe a família pra sambar
Lá no morro ele pinta o sete
Com ele ninguém se mete
Ali ninguém é fingido
Ganha-se pouco, mas é divertido.

Ele nasceu sambista,
Tem a tal veia de artista,
Carteira de reservista
Está legal com o senhorio...
Não pode ouvir pandeiro, não
Fica cheio de dengo
É torcida do Flamengo
Nasceu no Rio de Janeiro.

terça-feira, 3 de agosto de 2010

Cosmologia do Impreciso


Por que ler?


Pilulinha 12

IDA

As Baladas de François Villon são exemplares. O mergulho no submundo das prostitutas e dos marginais é uma estratégia divertida para o ensinamento das moralidades. Reflexivas se aplicam a toda sorte de desvios das normas de conduta não para com elas se deleitar, mas produzir o pavor do erro. Poeta de sua época, o grande francês anuncia tanto a emergência do sujeito quanto o controle que este sujeito sofre, proibido de usufruir os prazeres com o deleite devido e o gozo louvado. O louvor do gozo se disfarça de moralidade e a aceitação de sua leitura se torna corrente e correta.

VOLTA

A leitura contemporânea das Baladas de Villon incorre no erro. No duplo sentido que a frase anuncia. O erro de deslocá-lo de sua época, das moralidades a que era obrigado seguir, e o sublime erro de se desaprender com ele, lê-lo ao contrário do que escreveu. Em suma ler o grande francês como um anunciador de nossa época, em que a marginalidade e a prostituição se tornaram moeda corrente do prazer estático pelo desvio que representam.
(oswaldo martins)