quinta-feira, 18 de abril de 2013

Cavaquinho, novamente


A gagueira do violão de Nelson Cavaquinho, no Rei Vagabundo, me encanta toda vez que escuto a música; me ensinam poesia e o corte do verso os versos do Sempre Mangueira. Em que pese a sonoridade ão/ão dos 2º e 4º versos, o que dizem é tão preciso, tão perfeitos na percepção do fazer poético que poderia dizer, parodiando Manuel Bandeira, que, em relação ao verso de Chão de Estrelas – Tu pisavas nos astros distráida – dizia serem o mais bem acabado decassílabo da língua portuguesa, é a lição de construção poética mais intensa a que poderia chegar nosso cancioneiro.

Senão, vejam.

Os dois primeiros versos “Os versos de Mangueira são modesto / Mas há sempre força de expressão” trazem um pensamento antitético que localizam o fazer poético na amplitude de dois contrários que se adequam. A modéstia e a força. Houvesse a poesia brasileira seguido os conselhos do encanecido menestrel, não estaria presa aos vazios do nada dizer – que assombra boa parte dos leitores. Os versos seguintes “Nossos barracos são castelos / Em nossa imaginação” são sublimes por realizarem no plano do factual o que se propunha teoricamente.

Tomada a imaginação como índice da força de expressão, e os castelos como correlatos da modéstia, Nelson Cavaquinho realiza, para além da simples expressão corriqueira do redizer o já visto da linguagem cotidiana, uma suspensão no modo de se compreender o mundo e a formulação do próprio trabalho com a linguagem. As inversões se tornam tão renhidas e absolutas que o leitor/ouvinte deve saber que está frente a um caso único de sensibilidade poética. A daqueles que têm no saber da vida o sabor da linguagem e com elas fazem maravilhas.

(oswaldo martins)

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