Por escrito, de Elvira Vigna é um romance da linguagem.
Em meio à trama, desenvolvida pela narradora, o contar se problematiza mesmo
antes de se anunciar. Não por ser uma linguagem complexa, mas por, na sua
simplicidade de quase oralidade, dar a ver um mundo que o tempo todo se
constrói e se destrói. Romance feito de simplicidades complexas, paradoxo que cabe
não só à linguagem, mas na própria vida, o novo livro da autora é um correlato
mesmo das possibilidades humanas inconclusas.
É um belo livro
sobre a solidão humana, sobre a incapacidade de a linguagem dar conta das
relações que devem ser procuradas fora dela. Feita de silêncios, a narrativa deixa
que cacos perdurem aqui e ali e preencham com este movimento de subtração o que
a linguagem não dá conta de atestar.
O prazer da
leitura de Por escrito se deve ao fato de que a
incomunicabilidade se constrói a partir de outros vieses, como, por exemplo, a
construção a que se presta a narradora – quando a realidade ou os dados da realidade
são insuficientes para aplacar os desejos, tão pouco freudianos aqui – se
encontra na fabulação do real e toma aspectos tão densos e descontínuos como um
espelho da realidade, que se amplia em um sem-número de possibilidades. Neste
sentido leiam-se, com o cuidado que a linguagem requer, as referências à morte
de Aleksandra, cujas versões são muitas e inconclusas.
Há também no
romance de Elvira uma premência do falar feminino, sem as amarras que este
falar, classicamente, sempre teve em nossa literatura. A voz de Valderez é
sempre afirmativa, mesmo que a notícia que dá do mundo esteja repleta de
negatividades. São negatividades afirmativas.
A construção de Por escrito se delineia nesta multiplicidade de
paradoxos. Percebê-la é ao mesmo tempo dar conta de nossa multiplicidade frente
o mundo e descobrir a potência que a narrativa, essa, a de Elvira Vigna, cria, com
seus silêncios, de preenchimentos amplos e diretos.
(oswaldo
martins)
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