terça-feira, 17 de junho de 2008

Educação silenciosa

para o cláudio leitão

A presença constante dos amigos em nossa casa é um reflexo da educação silenciosa que meus pais intuíram. Sempre tivemos a presença de outras pessoas – que não as do ciclo familiar. Uns, como foi o caso do Sisson, amigo de muitos anos de papai, moraram conosco durante um período. Era interessante verificar sua presença no processo de educação. Palpitava à larga, na mesa, no diário da família, sempre apoiados por nossos pais. O Marcier – quando em Barbacena – sempre a parecia para uma conversa e para os intermináveis jogos de xadrez com meu pai. Ouvíamos, sem nenhuma censura, o que falavam, comentavam, sobre a vida, o amor, conselhos. De certa forma, também participávamos do último quadro que pintava. Para minha alegria, fui retratado por ele duas vezes. Uma, aos seis anos; outra, aos vinte e um. O Seu Paulo, que decorou nossa casa e era conviva da amizade e que, além de nos levar os móveis coloniais mineiros. Uns, originais; outros, cópias perfeitas de não sei que cômodas, que arcazes, que camas, que cadeiras. Fazia com que nos deslocássemos constantemente até Tiradentes – uma diminuta Tiradentes com poucos turistas e vida pacata. Uma Tiradentes onde ainda se colhia a pimenta do macaco e o deliciosos cambucá, nos quintais das casas.

Lembro-me, especialmente, do Sisson à mesa num dia em que se serviu jiló e um de nós recusou-se a comer a iguaria. Ante a hesitação – não sei se fingida, ou se real – de minha mãe, que presidia o almoço, ordenou – não há outra palavra – que nos fosse servido o prato sem que nada do que houvesse para o almoço pudesse ser esquecido ou negligenciado. Comemos, é claro. Agradeço a esse tio querido – pois era com esse tratamento que ele se inseria na família – o fato de nos fazer ter provado alguns pratos. Convivemos com ele – mesmo depois que ele foi morar em apartamento próprio, em Barbacena, e mesmo depois quando voltou para o Rio.

A presença destas pessoas ensinou-nos principalmente a diferença, a percepção do respeito pelas suas escolhas, pelas suas individualidades e, sobretudo, a percepção de que havia outros mundos para além do encerrado em casa, um outro mundo para além das escolhas familiares.

(oswaldo martins)

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