sábado, 23 de fevereiro de 2019

À FLOR DO FOGO


Bate o desejo suas lentas águas fundas,
e desata sobre nós: seus laços vivos – sôfregas: suas teias,
trançadas de relâmpagos. Digo:
aqui tens o colo que te dou.
E tu alongas o teu corpo em oferenda pelo chão:
o olhar pundonoroso que súbito trespassa,
implode – aferindo o rumor tocado
pelo ar − ao alto e em redor.
E eu revolvo os teus cabelos sentados no meu colo,
como quem perscruta um rio desde a infância,
e agora plantasse horizontes no teu rosto.

− Fecha os teus olhos, meu amor,
fecha os teus olhos, e abre − perfeita –
a lentíssima nudez – em flor
e fruto,
dançada.

As mãos devoram as mãos – devoram
suas marcas, seus ofícios: alimentam-se
do refazer esculpido e trabalhado dos corpos,
do estremecimento abrupto dos sentidos.
As línguas iluminam o sal dulcíssimo da pele:
como relâmpagos navegando
alucinados – procuram:
a secreta e nocturna flor do fogo.
E o ar perfuma-se de nós
como um bosque das suas árvores atentas.

E passam beijos que se demoram – sexo a sexo:
a respiração crepita num tremor jubiloso.
E todo o chão é lençol e mar − e dentro de ti,
eu te me dou inteiro
− oh meu amor
acabado de nascer!


                                                                            3.1-20.8.2013

(Zetho Cunha Gonçalves)

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