Oswaldo Martins. Poeta e professor de literatura. Autor dos livros desestudos, minimalhas do alheio, lucidez do oco, cosmologia do impreciso, língua nua com Elvira Vigna, lapa, manto, paixão e Antiodes, com Alexandre Faria. Editor da TextoTerritório
quarta-feira, 30 de maio de 2012
Pensante
No mercadinho da Zona da Mata, o
pensante fala a dois trabalhadores da casa, que atentam:
- 'Cês fala que esse papel
hingiênico é pra limpar o coiso, mas num limpa: espaia. O que alimpa mes' é
água e sabão.
Virou as costas e saiu indignado
sem levar o pacote de rolos caros alvos.
Cláudio Correia Leitão
segunda-feira, 28 de maio de 2012
Flagelo da putas
Ah, as histórias do Doutor sempre
me deliciaram, você sabe. Por isso o visitava muitas vezes em seu consultório. Pretextava
uma dor qualquer, para visitá-lo. Sempre fui recebida com alegria. Neste dia,
passava pela porta, há muito tempo não subia as escadas, para dar um olá, saber
das novidades e contar outras.
Ao entrar na antessala, vi que
não havia ninguém. A secretária já havia se ido, as clientes não mais estavam. Bati
com as pontas dos dedos, pronta me retirar, quando ouvi a voz bonachona e
despreocupada, dizendo para esperar. Ouvi a cadeira sendo arrastada. Levantou-se,
com a elegância que tinha e abriu-me a porta de par em par, perguntando logo
pelas novidades, Mariinha?
Olhei de esguelha, o Doutor lia
um livro muito grosso. Sabia que, naquela cidade enfadonha, para ele valiam os
livros e as pequenas histórias com que atiçava sua necessidade de saber das
coisas do mundo. Eu podia até me considerar parte daquele vício, com minhas
histórias. Eram histórias de putas, mas sabia que o deixavam contente.
Falei. Sabe a Dorvalina? Pois é,
fui lá no castelo dela. Disseram que estava acamada. Soube? Sim. Visita de uma
para outra, que no nosso mundo é assim, disputamos as moças e os homens, mas
resta entre nós desapego. E ela me contou que um certo senhor, distinto, mandou
em embaixada um moço. Queria experimentar essa vida. Ela se riu. Veja você, comadre,
disse.
Esse senhor queria ou queriam
para ele, não sei. Uma das moças, para tudo. Mandei uma delas tomar banho, se
vestir, perfumar. No dia seguinte soube. O senhor andou pelas casas querendo
fechar, impor decência. Isto antes. Falou com aquele jeito entrecortado dela lá
contar suas histórias. O isto veio puxado, em “s”. achava chique dizia ser bom
para o ofício, davam mais sustância ao cabaré.
Mas soube no dia seguinte, preambulava.
O Torquemada das putas enfim sucumbiu. Ria-se. Parece que não foi ele, mas
amigos dele. Armaram em um sítio não muito distante daqui. A moça foi de carro.
Disse ela, sabe, né, dona Dorvalina. O homem estava nervoso, sem funcionar
direito. Aí, não tive dúvida, abocanhei. O homem gostou. Quer novamente.
Mariinha riu-se gostoso e
satisfeita, imitando a fala de sua comadre. Ele gostou, agora só vai querer
saber disto.
(Oswaldo Martins)
quinta-feira, 24 de maio de 2012
quarta-feira, 23 de maio de 2012
nas ruas
o corpo é o cão-guia
da alma
do outro
não importa
no escuro
ou na luz
nada se vê
tudo
se transborda.
(Lúcia Leão)
Arte de amar
ARTE DE AMAR
Se queres sentir a felicidade de amar, esquece a tua alma.
A alma é que estraga o amor.
Só em Deus ela pode encontrar satisfação.
Não noutra alma.
Só em Deus - ou fora do mundo.
As almas são incomunicáveis.
Deixa o teu corpo entender-se com outro corpo.
Porque os corpos se entendem, mas as almas não.
Manuel Bandeira
O poema do Elesbão trouxe-me de imediato a lembrança do poema de Bandeira.
um corpo
um corpo é corpo
e porque corpo
ora precisa ser abraçado com carinho
ora precisa ser abraçado com tesão
e porque corpo
nada sabe dos pecados da alma.
elesbão
(22/05/12)
quinta-feira, 17 de maio de 2012
die ballade von der sexuellen horigkeit
Das quatro, qual a melhor? Sem contar é claro a beleza da versão do Carlos Careqa
quarta-feira, 16 de maio de 2012
Capa de chuva ou escansões para os fios da noite
A duração da ação trágica é de um
dia, do nascer ao por do sol, neste período deve o personagem trágico passar da
boa para má fortuna ou da má para a boa fortuna, bem como descortinar as
questões políticas e sociais que envolvem a polis. Na ação de No Fio da Noite, Ana Teresa Jardim inverte o preceito
aristotélico e faz de sua personagem elemento noturno. A prostituta argentina
Nena, protagonista da história, vai vivenciar no período de uma noite, do por
do sol ao seu nascer, os problemas que fazem parte da cidade que a mal acolheu.
Além do périplo peripatético de
Nena pela noite do Rio de Janeiro, as descrições da cidade são de beleza
incomum, pois o que se mostra da cidade não é o ambiente edulcorado das praias
e inconteste mitificação tão ao gosto dos nativos que se põem a falar e a discorrer
sobre ela. A cidade aparece inteira, com seu poeta e gravador (as descrições
das gravuras do descendente russo Boris me lembraram as gravuras de Goeldi),
com seus gangsteres e proxenetas, mas sobretudo no seu ambiente mais denso que
é o da noite do cais do porto e das ruas edificadas ao acaso desse delicioso
Rio de 1922, com seus sambistas e artistas ambulantes.
A leitura de um fôlego só, como
se a noite nos obrigasse a vivenciá-la por inteiro e no mesmo ritmo do romance,
demonstra a maestria da composição e as deixas que a narrativa vai plantando
como sucedâneo da irrealização do texto e, ao mesmo tempo, da realização do
imaginário que o preside.
Outro detalhe importante saboroso
da composição de No Fio da Noite está presente nas
páginas finais em que a verossimilhança parece comprovar a adequação e o
equilíbrio da narrativa. Refiro-me aos “quase anexos” que dão conta da
investida ficcional. As receitas, a crônica de Tulio Neves, a carta de Irena e,
sobretudo, a deliciosa notícia publicada na revista A Passarela, de agosto de
1922, na qual se dá conta da moda que toma o Rio de Janeiro – “o uso da capa de
chuva, ou impermeável, de corte masculino, à guisa de vestido” (93). Lançado
por Nena, a moda intervém precisa e determinadamente nos costumes da cidade e sugere
que a moda das mulheres desta cidade e a própria cidade se compuseram através do
contato unisual dos mundos separados e fundidos num mesmo e paradoxal ato de constituir
a própria cidade.
Ana Teresa Jardim sabe, como
afirma o poeta[i],
que a sagacidade está em saber farejar delícias.
(Oswaldo Martins)
terça-feira, 15 de maio de 2012
rolleiflex
I.
fotografei você com a minha rolleiflex
na revelação
naquilo que revelei
a nokia está no lugar do teu rosto
II.
eu fotografo
tu fotografas
ele fotografa
nós fotografamos
a máquina que nos fotografa.
elesbão
(14/05/12)
um corpo
um corpo há de ter boca
por onde outro corpo
possa entrar dentro desse corpo
de que vale um corpo
se a boca desse corpo
não se abre a outro corpo
de que vale a um corpo
ter boca ter língua
se as bocas desses corpos não se abrem
se as línguas dessas
bocas não se entrelaçam
se a saliva dessas bocas não se mistura
elesbão
(05/05 -14//05/12)
sábado, 12 de maio de 2012
Poemas Pina
Vitela 1
Dançar na ponta dos pés
com a vitela
sacrificada.
Ó vitela cariátide
de bailarina
asceta no metrô
aceita este pobre sacrifício.
Vitela 2
“Isto é
carne de vitela !”
gritou a bailarina
antes de iniciar
o sacrifício
antes de
enfiar
filés
para saciar
a fome dos
pés.
No final
do filme
de Wenders
o fadista canta:
“olhos
são rosários
de atenuar
a dor do vivente.”
11/05/2012
Luiz Fernando Carvalho
quarta-feira, 9 de maio de 2012
Estação 1
1
os becos-labirinto
passeiam a cidade escusos
becos dorme um
mendigo se tem rugas se a mão
toca o fino deleite
do pelo em crespo pó oco
a voz tateia por um
leite pelo crack a bolsa
dos avantesmas
vestidos de terno agarrada ao
peito fede mijo fede
a sêmen coagulado no ai
meu deus dos
prostitutos dos mercados e medo
beco a cidade medra no
abuso-ruas que retina
alguma guarda da
língua vestígios-língua quê
baba de humores badalo
das gurias imperdidas
que trafegam buceta
e riso e velhas esquinas
e passam as mãos
pelas bolas com que jogam a
sinuca co’os bicos
(oswaldo martins)
segunda-feira, 7 de maio de 2012
Literatura em sala de aula
1 – Há alguns aspectos a se
considerar quando se pensa no ensino da literatura e na organização curricular
que o dirige. O primeiro deles é o lugar de onde parte o professor, pois há
duas formas de considerá-lo:
· A empatia que o professor tem com a literatura,
sua bagagem de leitura, seu trato pessoal com o texto literário, levando-se em
conta os aspectos técnicos do ensino e da teoria que serão enfocados em sala de
aula;
· A necessidade de se ater à burríssima divisão
histórica de que a maioria das grades do ensino da literatura parte. Barroco,
Arcadismos, Romantismos, Parnasianismo etc.
O professor meramente técnico
pode até “ensinar” ao aluno as fases, o significado do que é literatura e
fazê-lo entender os períodos e suas relações com a história, com a filosofia,
com a sociologia ou com a matemática. Entretanto, um dos aspectos mais densos
que a literatura traz é a capacidade de localizar o sujeito no seu mundo e a
partir daí poder fazer a crítica da linguagem do senso comum – que é a do uso
habitual da própria linguagem. Esta capacidade só pode ser oferecida ao
aluno-leitor se se faz compreender o deslocamento mimético produzido por essa
outra linguagem – nada usual – que é a linguagem literária. Sem este
deslocamento, é impossível ao aluno-leitor perceber a potência contida no texto
literário.
Atingir essa potência,
demonstrá-la e fazer com que seja possível senti-la é, pelo que me parece, uma
das possibilidades que tem o professor de literatura, em quaisquer níveis da
educação. Em outras palavras, é preciso fazer com que o aluno-leitor ponha a
mão na massa.
Na minha prática de sala de aula
algumas proposições são constantes. A começar por abrir espaço para a teoria,
mesmo que sejam árduos os caminhos da compreensão da matéria teórica – como diz
Luiz Costa Lima, teorizar não é aplicar
uma receita de bolo ou dominar um conjunto de regras fixas e imanentes, mas é
sobretudo fazer dançar o pensamento, com o rigor e a precisão que uma passista
tem ao adentrar a avenida ou o poeta grego que fazia dançar o seu dançado.
Explico-me: é necessário deixar o pensamento assentado sobre um ajuste rigoroso
e frouxo ao mesmo tempo, como uma peça de encaixe que, ao se acoplar a um
suporte, mantenha com ele uma relação de desconfiança, pra que se possa ajustar
e modificar os ajustes, quando a mobilidade de pensamento assim o exigir.
O passo seguinte é o da leitura,
muita leitura, sem querer saber se leitor-aluno goste ou não de determinado
livro. O que o aluno tem de compreender não passa pelo gosto, mas pela
capacidade que determinados livros possuem de fazer com que as situações do
cotidiano sejam refletidas e postas sob suspeição, mesmo as características
mais caras ao processo civilizatório. O império da lei foi construído e suas
verdades naturalizadas. Ao ler os seguintes versos de Baudelaire, deve o aluno
compreender que todo o processo civilizatório está sob suspeição e que a
radicalidade expressa pelo poeta tem como visada um outro ponto.
Se o veneno, a paixão, o estupro,
a punhalada
Não bordaram ainda com desenhos
finos
A trama vã de nossos míseros
destinos,
É que nossa alma arriscou pouco
ou quase nada.
As percepções contemporâneas
devem se assustar, com o texto literário. Podem se perguntar: mas dar isso para
um adolescente, meu Deus? Sim, é isto e não outras expressões o que se deve dar
a ler. Os aspectos de certos romantismos, hoje, apenas tentam dar ao construto
literário um lugar aceitável na ordem do mundo. É preciso rejeitá-los. Nada
pior do que os ai que saudades que eu tenho, que abundam como o modelo de
literatura, ainda que pese a radicalidade modernista.
O terceiro passo está em fazer
com que o aluno-leitor ponha a mão na massa e recrie a linguagem a traduza em
atos concretos, que nunca podem ser uma prova; são preferíveis os debates, os
trabalhos de desnudamento dos textos feitos pelos alunos-leitores.
Passo a relatar algumas
experiências vivenciadas em sala de aula:
· A formação de um parque de diversões a partir e
de textos.
· A recriação do Rio do século XIX, a partir da
leitura de Machado de Assis, Aluísio Azevedo e Manuel Antônio de Almeida.
· A criação de um manifesto literário, criado e lido
em praça pública pelos alunos.
· A criação do Cortiço físico, em que as pessoas
pudessem entrar e vivenciar, não o cortiço, mas a sua mímesis e assim compreender que o que Aluízio Azevedo faz não
é o retrato de um cortiço, mas a sua emulação
· A criação de um jogral com poesia.
É preciso ressaltar que quem
torna possíveis essas experiências são os alunos e não o professor que, quando
muito, dá uma de songa-monga e reutiliza o vivenciado como reflexão sobre o
texto literário, fechando o círculo.
Gostaria de ler um poema do
Cosmologia do Impreciso, está na parte que se nomeia arte da deseducação na
qual tento pensar a questão da sala de aula:
tertúlias
Nas aulas todo domínio é cínico
Inventam-se nomes para profissão
nenhuma
nas aulas mente-se desde o que
não se sabe ao que deixarão de
saber
nas aulas a correção absoluta
ensina o desconforto
a tristeza
a traça que corrói todas
as conquistas
e abismos
(Oswaldo Martins)
domingo, 6 de maio de 2012
Dora Ribeiro em Madrid lendo seus poemas
Foto: Antonio Veiga
El lenguaje puede ser reducido a su
expresión más perdurable y básica ― la palabra ― como el cuerpo humano al
esqueleto. Este curioso paralelismo entre hueso y palabra poética es algo que
me hizo descubrir, en Madrid, Dora Ribeiro. La poeta brasileña estuvo leyendo
sus poemas en la Residencia de Estudiantes una tarde plomiza y aciaga en la que
el pueblo de Madrid protestaba por los continuos recortes presupuestarios y las
condiciones draconianas a las que nos obliga nuestra permanencia en la
Comunidad Europea. Y es que ha finalizado esa época de vacas gordas mal
gestionada por políticos y banqueros prepotentes e incompetentes, que son
adjetivos que se parecen tanto que bien podría pensarse que se trata de uno
solo. Como digo, en aquella tarde aciaga, se dejó oír la voz cuidada,
melodiosa, tal vez titubeante, de la poeta Dora Ribeiro diciendo, sugiriendo,
apuntando esta similitud entre hueso y palabra, entre poema y adivinación.
osso
hueso
oráculo
oráculo
osso
hueso
de
tanto se repetir de tanto
repetirse
a
lengua vibra la
lengua vibra
em
estilhas e en
astillas y
se
inicia em novos se inicia
en nuevos
significados significados
Este poema recogido en el libro Olho
empírico, que me he permitido traducir, explica esa relación entre la palabra
poética y el desvelamiento de una realidad hecha de tiempo y espacio, de
distancias y duraciones intercambiables. El poema es una plegaria que, a fuerza
de repetirse, se quiebra, pero que, milagrosamente, como toda plegaria, emerge
con nuevos significados que no estaban en sus palabras. Es una jaculatoria
mágica ― el poema ― que busca expresarse entre los ruidos del mundo desvelando
y revelando lo que queda oculto. Es el hueso bajo la piel, que llama al
músculo, a la víscera y a la piel para habitar el mundo. Es el hueso que no son
capaces de roer las pequeñas larvas a las que dedicó su libro Brás Cubas. Y ese
hueso, esa semilla de lenguaje se hace carne y vive con nosotros. “Creo que hay
palabras que nos observan, nos enseñan, nos acompañan por la vida. Y nos dejan
su marca”, explicaba en Madrid la poeta nacida en Campo Grande. También yo lo creo
así. La vida es una experiencia que las palabras alumbran. Por ellas sabemos y
amamos, por ellas entendemos y nos comprometemos, por ellas, con ellas, nos
comunicamos. Y morimos. La existencia es lenguaje. Por eso la palabra-hueso
genera nuevos cuerpos, nuevos significados, habita en tierras desconocidas, se
multiplica en otros poemas, en otras anatomías, provoca una reencarnación
interminable de seres, vidas, lenguajes. Como las ondas del mar, como la
vibración interminable del universo, como el aliento palpitante de lo
existente, la palabra y el poema se multiplican y se suceden, se desarrollan en
una corriente de fuerza y sentido. Dora Ribeiro reconoce esta capacidad motriz,
este movimiento interminable en su poesía y en su vida. Onda o partícula la luz
recorre de parte a parte el universo para iluminarlo. Sea aliento o escritura
la palabra poética atraviesa nuestra vida para dotarla de sentido.
palabras enteras palabras enteras
abrem-se se abren
já divinatórias adivinadoras
e escandalosas y escandalosas
fazendo morrer em haciendo morir en
mulheres e mujeres y
homens as suas hombres sus
primeiras imagens primeras imágenes
Foto: Antonio Veiga
Pero la voz se quiebra ― a fuerza de
repetirse ―, se fragmenta y, de la ruina de los sonidos, de los fonemas, surgen
los nuevos significados, las nuevas realidades que habitan en nosotros. La
palabra es mágica y es comunitaria: hace pueblo y desvela la identidad, la
nuestra y la de nuestra gente, la del hombre y la de la humanidad. Las palabras
desbaratan las primeras imágenes, fueron los rudimentos de nuestra infancia,
nos sirvieron para entendernos y entender el mundo. Primero nos indicaron quienes
éramos y dieron un nombre al enigmático “yo”, cerraron nuestro cuerpo y lo
distinguieron de los otros cuerpos. Era la palabra reveladora y profética que
aprendimos como aprendimos los nombres de los que nos protegían, de nuestras
necesidades físicas, de nuestros miedos ancestrales. Para Dora Ribeiro la
poesía hay que entenderla como movimiento y como infancia: Como movimiento
porque es natural y es fuerza ciega y está impregnada de historia. Como
infancia porque sólo los niños saben inventar y configurar lenguajes absurdos,
impenetrables, esclarecedores. Lo dijo así: la poesía es “nuestro más fiel y
duradero animal”. Si no se siente la poesía como algo vivo, palpitante, como un
cuerpo que se mueve y respira y se alimenta, si la palabra poética no se entiende
como un oráculo y, a la vez, como un hueso indestructible, que sirva de armazón
a un significado todavía por desvelar: si no es así, el poema ha muerto. Sin
embargo, la voz poética es cómplice y está viva: es viento y es aroma, es voz y
es recuerdo, es el pulso en la sangre y es el juego sideral de los astros, es
silencio burbujeante y es vacío en plena tensión. Uno y múltiple, en la
resonancia interminable de las voces, la palabra, el poema se reproducen como
una célula o un organismo.
sob manhãs moventes bajo mañanas móviles
pensar os alrededores pensar los alrededores
e seus sexos y sus sexos
é obra de demolição es obra de demolición
Dora Ribeiro concluye este poema que
abre un libro, o parte de un libro titulado “escritura de demolición”, con esta
estrofa. Son móviles las mañanas, vibrantes, como antes lo era la lengua
generadora de palabras ― la lengua-instrumento, la lengua-órgano ― que crea la
mañana y la nombra como a sus contornos espaciales o temporales, a sus
silencios y a sus misterios. Pero las mañanas como los que la habitan son
móviles y vagan ― los seres ― anclados tan sólo por sus sexos, por el fruto que
los liga a la tierra y a la sabia del mundo. Sexos que chocan y se entreabren
como las flores y los frutos: sabrosos, delicados, aromáticos. Pero todo ello,
apunta la poeta, es obra de demolición. Se derruyen las anatomías, los cuerpos,
para que se mantenga la vida. Se rompe la estructura del lenguaje para que
desde sus cascotes-sílabas, desde sus letras-astillas se construya otro
significado, una visión nueva de la historia y de la vida.
La luz de la tarde se difuminaba en la
ciudad. En la intimidad de la sala habíamos escuchado las palabras redondas,
extrañas, reveladoras. Nos habían hablado de distancias, de estallidos de
belleza, de abismos y fiestas salvajes, de músicas y de silencios, de tiempos
líquidos y de cuerpos-escrituras, de vacíos y de jardines, de caminos y de
miradas, de geometrías y de cuerpos, de reescrituras y demoliciones, de
construcciones… La palabra poética, que nacía y renacía una y otra vez, con su
hueso y su piel, con su aroma y su sonido, alumbró fugazmente, a fogonazos, la noche
y se disolvió en la oscuridad. La tarde había quedado preñada de escondidas
verdades que nadie sabría repetir, pero que todos sentíamos en la carne y en la
conciencia. Y con ese vago perfume, con ese presentimiento, nos abandonamos a
nosotros mismos tal vez repitiendo mecánicamente, como una oración a un dios
desconocido: hueso, oráculo, hueso…
* * *
Antonio Maura é escritor, crítico
e professor universitário espanhol. Sócio Correspondente da Academia Brasileira
de Letras (julho, 2011) e assessor da Fundação Cultural Hispano Brasileira. Tem
publicado, entre outros, os romances Voz de Humo e Semilla de Eternidad, e o
livro de contos Piedra y Cenizas. Faz parte do Conselho Editorial de Cronópios.
sábado, 5 de maio de 2012
Dois poemas de Wilson Sena
1999-2001/Soure
a Ruth, Fernanda e Daniela
desregulagem na garatuja:
se linear - o oco.
vertical
Um feto fixo dilui-se num soco e
se amplia no seu deserto dentada
(Wilson Sena)
a Ruth, Fernanda e Daniela
desregulagem na garatuja:
se linear - o oco.
vertical
Um feto fixo dilui-se num soco e
se amplia no seu deserto dentada
(Wilson Sena)
sexta-feira, 4 de maio de 2012
Poema do dia
o meu rio não existe
mas nas minhas águas brilham
práticas de muitas cores
quando há grande festa
no mar
colhe-se sólida e
verdadeira companhia
na observância do vento
e das monções
(Dora Ribeiro, Taquara Rachada - 2002)
mas nas minhas águas brilham
práticas de muitas cores
quando há grande festa
no mar
colhe-se sólida e
verdadeira companhia
na observância do vento
e das monções
(Dora Ribeiro, Taquara Rachada - 2002)
quarta-feira, 2 de maio de 2012
O QUE É QUE NÃO É
Sábado das Crianças - entrada franca
Mal saiu do forno, o livro já foi selecionado para o Programa Nacional de Biblioteca da Escola – PNBE, e chegará às bibliotecas das escolas públicas de todo o país.
O lançamento abre um novo espaço da Estação das Letras, dedicado ao encontro de escritores com o público infantil. Cesar vai contar a história e conversar com a garotada que comparecer à Estação das Letras.
Saiba tudo sobre isso em nosso Blog
Dia 5 de maio (Sábado), a partir das 15 horas.
Rua Marquês de Abrantes, 177 - Lojas 107/108
Flamengo - Rio de Janeiro
Tel: (21) 3237-3947
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