terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Memórias esotéricas 3


Estava sentada na cama, velha pelancuda e nua em um quarto pequeno e pobre. Olhava para o nada, concentrada na memória que não estava ali. Fazia frio e o aquecedor velho chiava. O calor soltava pequenos fragmentos de brasa, mas meu peito estava ressequido, meu colo depunha camadas de colares naturais, como cascatas de pérolas sujas.

A pensão, como um retrato deste tempo que já não é o meu, estava vazia e silenciosa. Velhos como eu habitavam seus quartos e pouco saíam de suas camas. Os estudantes estudavam, os motoristas dirigiam seus carros, os condutores conduziam, trabalhadores trabalhavam e os relógios marcavam o tempo zero e nunca repetiam as cinco horas do chá nem deliquesciam as horas dúbias de dali.

Havia pressa e ninguém mais fazia do sexo sua arma fatal contra a hipocrisia das famílias, todos trepam mulheres homens gays em comunhão com o santo cristo e a família eclesiástica dos inventores da morte e do casamento de que pretendem herdar com a segurança dos que se pretendem eternos.

Estar sentada aqui nua, coma s pelancas fazendo-me as vezes de colar pode ser considerado um ato de resistência contra o mundo.

(jurema silva)

Nenhum comentário:

Postar um comentário