sexta-feira, 15 de julho de 2011

O inferno de Strindberg

Toca a sineta pra o almoço e, à mesa, encontro-me em macabra companhia. Caveiras e agonizantes: a um falta-lhe o nariz, a outro um olho, adiante vejo um doente como lábio caído e a face em putrefação. Mas há dois que não têm ares de enfermos; ostentam, no entanto, uma expressão de desesperada tristeza. São refinados ladrões que agiam na alta sociedade e conseguiram, através de prestigiosas relações, um relaxamento de prisão por motivo de doença.

Um repugnante cheiro de iodofórmio me tira o apetite e, como tenho as mãos envoltas em curativos, devo recorrer-me aos companheiros para cortar o pão e servir-me de beber. Neste banquete de criminosos e condenados à morte, a boa Madre Diretora, vestida com seu austero hábito preto e branco, dá a cada um de nós uma beberagem envenenada. Levanto minha taça de arsênico e troco um brinde com uma caveira, que, por sua vez, me saúda com seu copo de digitalina. É lúgubre, mas, assim mesmos é preciso ser grato, o que me faz ficar furioso. Mostrar reconhecimento por uma coisa tão medíocre e desagradável.

(August Strindberg – Inferno – Editora 34, São Paulo, 2009 – tradução de Ismael Cardim)

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