quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Poesia

Alguns anos atrás, ouvi falar de Ungaretti. Já havia lido Paul Celan, Georg Trakl e Mallarmè. São os meus poetas de eleição, como antes de conhecê-los tinham sido Baudelaire, Poe e Rimbaud. Neles havia encontrado como domar o poema, a partir daquilo que a expressão necessitava – precisão, contenção e sobretudo um delírio inexplicável que cabia em poucas palavras, em uma sintaxe que nada tinha a ver com a sintaxe tradicional, no sentido de arrumar os períodos, para que comunicassem o comum.

Outros poetas vêm sempre se juntar ao quartedo. A eterna Safo, Cesário Verde, Cabral. Murilo, Haroldo, Dora. A poesia é um carta mágica para que se possa sobreviver à bárbarie – talvez no mesmo diapasão da música. O que há, quando, por exemplo, lemos que sempre comove o voo negro dos pássaros? Hora nua, hora de espanto e voo. Poesia. Não é o canto ou sequer a proximidade com o canto dos pássaros o que nos deixa perpplexos, mas essa intuição que aproxima o canto humano do voo negro dos pássaros.

Se tomamos o voo/canto o canto/voo como um dizer equilibrado, contido e determinado, do nosso espanto negro frente a palavra e as sintaxes de que elas são capazes, não é por suas metáforas, metonímias, paradoxos que o tomamos, mas pelo poder de dizer o que não dizem as metáforas, metonímias ou paradoxos, isto é, a palavra enfim nua de contágios como o canto que os pássaros transformaram em voo negro, em canto negro e inintelígel senão que aos estudiosos, senão aos que sensibilizados com a tradução do que somos.

(oswaldo martins)

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