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Quando JM não nascera, as
partes de seu corpo pairaram sobre diversas cidades do mundo. Tivera a sorte de
as conhecer antes de que dele soubessem. Não vagou pelo mundo à toa, antes
compreendera que não estar era uma forma mais profícua de se dar a apreciar e
recolher pedaços de realidade que mais serviam para traduzir um sistema falto
de sentido. Imiscuíra-se entre as gentes e, por isso, frequentou espaços
jungidos em suas diferenças, sem a necessidade de traduzi-los nas formas aceitáveis
da alienação, que mais se pareciam a enormes rinocerontes, a rostos desfeitos
pela multiplicidade dos olhares, a corpos nus e bem dispostos pelas ruas,
trabalhados com as réguas perfeitas do entendimento. Vivera o anímico das
mitologias, antes de os homens pensarem nos significados que iriam adquirir,
para que eles pudessem dar respostas elaboradas aos enigmas, às físicas
universais, ao amor e aos trigos, com que fizeram o pão, às bagas de uva e aos
desesperos, com que cavaram sepulturas na terra. Assistira à entronização da
exploração antiga e às televisões e aparelhos do mundo contemporâneo, tudo
reificação do medo e da miséria, transvestida em letras garrafais. À sedução do
inalcançável, este bichinho que rói como uma bandida, fabricada às pressas para
construir um arcabouço explicativo a que faltaram peças para se escancarar a máquina
de moer e destroçar corpos.
Um porco, enorme capado,
rebolava o rabinho. Era uma graça de se ver, mas JM não vivera para apreciar a
maciez dos tenros pernis. Estivera ali, é certo. Tocara adiante e reservou para
este lugar o esterno, com o assombramento dos que intuem se colocar no lugar do
nobre animal. Dispensara o banquete, a flauta que tocava não traduzia em sabor
a réstia de sol que se abateu bem no centro nervoso. Guinchava na descoberta cuja
lição os livros de anatomia escondiam, com discursos vãos sobre o sustento da
vida, sobre a ternura, transbordada dos olhos recém esfaqueados na celebração
do festim da órbita oca.
JM ainda não fora ao
longo do tempo, que invernara nos antes dos conformes do nascer, um Zé, um João
Ninguém, o nano corpo a ser formar, durara séculos de probabilidade e nada que
se pudesse tentar para fazê-lo pular para dentro da vida lhe dera suficiente
sagacidade. Desenho que atirava toscos tocos na direção infinita das pipas de
céu e vento.
Os baba-ovos, os
remenda-corvos, os salve-salve torciam as mãos satisfeitos com o monstro que
teimava, que teimava em se manter, enfim, até onde pudera só já não nascer.
(oswaldo martins)
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