quarta-feira, 10 de julho de 2019

relatos mais pequenos sobre coisas miúdas

para oswaldo martins

Surpreendeu parentes e amigos ao desfazer o noivado. Tão bem apanhado, tão bem situado, juiz de primeira instância; é uma tonta a nossa filha, dizia a mãe. Ó rapariga o que fizeste? Por que mandaste o rapaz embora. Escreve sonetos parnasianos, meu pai.
Fizeste bem.

Elesbão Ribeiro

segunda-feira, 8 de julho de 2019

desimitação anafórica


há quem escreva a partir do divã
e consinta dores a palavras vãs

há as que clamam por divãs
há as que clamam por odivan

outras se satisfazem com onã
outras se veem estrelas anãs

outras anáforas de aldebarã

(oswaldo martins)

segunda-feira, 1 de julho de 2019

Leitura de agosto


Leitura Agosto

A Borra do café

Em A borra do café, Mario Benedetti mescla memória e invenção e resgata as lembranças de sua infância em Montevidéu para construir uma narrativa lírica, profunda, sobre as surpresas e as dificuldades do amadurecimento. Com seu peculiar lirismo e habilidade narrativa, o autor relata pequenos acontecimentos de uma vida distante, fazendo com que o leitor reconheça a si mesmo.

Na figura do jovem Claudio, o consagrado escritor uruguaio, autor de A trégua, reinventa muitas passagens marcantes de sua própria vida: as brincadeiras de rua com os amigos, as constantes mudanças de bairro com a família, a trágica morte da mãe e a descoberta do amor e do sexo.

Em seu texto de apresentação do livro, a escritora Martha Medeiros destaca que toda história de infância corre o risco de parecer piegas. Mas que, no caso Benedetti, a narrativa escapa desta sina, graças ao talento do escritor. Ressalta ainda que, com mais de 80 livros publicados, a poesia comum a seus livros jamais o deixou na mão, mesmo quando não era um poema o que escrevia. “Fosse um manifesto político ou uma história contemporânea, sua emoção permaneceu desinfetada de lugares-comuns”, descreve.

“E não foi diferente quando escreveu A borra do café, que conta a história de um garoto de Montevidéu que se apaixonou primeiro pela professora e depois por uma menina que ele não sabia se existia ou se era fruto da sua imaginação. Um dia, descobriu o cadáver de um mendigo, confrontando-se com a morte pela primeira vez, e logo perdeu a mãe, aos 12 anos, tendo com a morte uma intimidade ainda mais indesejável. De primeiras, segundas, terceiras vezes se faz essa ficção com jeito de biografia. Benedetti nos conduz com humor e lirismo às suas aventuras e desventuras, tenham sido elas vividas ou inventadas”, aponta a escritora em seu texto de orelha.

Segundo o Jornal público o romance de Banedetti:

A prosa sóbria de Benedetti, tão característica do seu estilo, narra uma história realista (mas pontuada em vários episódios decisivos pela menção a uma hora “mágica”: as três e dez da tarde; o elemento de conexão entre o tempo e as circunstâncias) que no último capítulo se transforma em onírica e com elementos que por momentos poderão evocar o “realismo mágico” ou o fantástico: Claudio viaja de Montevideu para Quito, no Equador, para participar numa reunião profissional, numa companhia aérea que ninguém conhece, a Aleph Airlines, e já durante o voo o comandante anuncia que se dirige para Mictlán. Ora, a referência ao Aleph remete de imediato para o livro homónimo de Borges – em que as histórias têm como tema o sentido e o significado do tempo, o enigma do Universo e a compreensão da eternidade, a transcendência da palavra – e Mitclán é o nome do reino dos mortos nas culturas pré-colombianas. Mario Benedetti sublinha assim as relações entre a vida e a morte na reconstituição da vida de Claudio.

A bela senhora Seidenman

No cotidiano abalado pela ocupação alemã da Polônia, Szczypiorski busca o retrato da humanidade no século XX. O gueto judeu de Varsóvia resiste, com seus personagens marcantes, como o rebelde Pawełek Krynski, alter-ego do autor, produto do país onde convivem poloneses, judeus, alemães e outros; e o velho ferroviário socialista Filipek, que se engaja numa aliança peculiar com o alemão Müller — e toda uma rede de vizinhança — para salvar dos porões da Gestapo a bela senhora Seidenman que enfrenta, determinada e desafiadora, seu verdugo nazista.

Sobre o romance escrevei Moacyr Scliar:

Paixão
Estamos diante de um romance de ideias, mas escrito com uma paixão avassaladora, que envolve por completo o leitor. O cenário é a Varsóvia ocupada pelos nazistas, no tenso período em que os judeus estavam sendo enviados para o extermínio.
A senhora Seidenman, uma judia que, ajudada por amigos poloneses, consegue convencer com sucesso o comandante nazista de que é polonesa, na verdade nem é a figura principal (diferente das edições em francês, inglês e português, em polonês a obra intitula-se "Poczatek", o começo).
Junto dela temos uma galeria de personagens, todos envolvidos, direta ou indiretamente, na perseguição aos judeus: a irmã Verônica, que salva crianças judias convertendo-as ao catolicismo; o jovem rebelde Pawel, um alter-ego do autor; o alemão Mueller, que ajuda a senhora Seidenman, enganando o comandante nazista Stukler; o assaltante Wiktor Suchowiak, que salva a menina judia Joasia. É verdade que há também tipos abomináveis, como Bronek Blutman, que sobrevive denunciando outros judeus.
Aliás, se algum reparo pode ser feito ao romance, é exatamente este: fica visível a ânsia do autor pela equanimidade, o que se manifesta na seleção de personagens - em cada grupo existem os "maus" e os "bons". Mas predominam estes últimos, a demonstrar que, mesmo nas piores circunstâncias, podemos encontrar gente decente e idealista.
É, convenhamos, uma mensagem que não ouvíamos desde os tempos da literatura engajada. Mas é uma mensagem resultante de coerência pessoal do autor: "Uma Missa para a Cidade de Arras" (1971), que abordava a perseguição a judeus e heréticos no século 15, já se constituía em resposta à campanha antissemita então em curso em seu país.
Andrzej Szczypiorski deu uma importante colaboração para melhorar as relações entre poloneses, alemães e judeus, o que lhe valeu o Prêmio de Literatura Europeia (Áustria) e o Prêmio Nelly Sachs, este com o nome da grande poeta judia.
Em homenagem póstuma, em 2002, o então ministro de Relações Exteriores da Alemanha, Joschka Fischer, ressaltou a coragem do escritor frente aos desafios totalitários do século 20. Coragem da qual este livro dá admirável testemunho.


05/08 – A borra do café – Mário Benedetti

12/08 – A borra do café – Mário Benedetti

19/08 – A bela senhora Seidenman - Andrzej Szczypiorski

26/08 – A bela senhora Seidenman – Andrzej Szczypiorski


Local: Rua Pires de Almeida 76/201- Laranjeiras
Duração dos encontros 1:30 h.
Horário: das 20:00 às 21:30 h.
Custo: 400,00 reais os quatro encontros
Mediador de leitura: Oswaldo Martins

Inscrições pelo tel (21)981438622

Oswaldo Martins, nascido em Barbacena – MG, em 1960, reside no Rio de Janeiro desde 1979. Fez graduação em Letras (Português-Literatura), pela PUC-RJ o mestrado (Literatura Brasileira), pela UERJ. Autor dos livros desestudos (2000 -  7 Letras / 2015 TextoTerritório); minimalhas do alheio (2002 – 7 Letras / 2015 – TextoTerritório);  lucidez do oco (2004 – 7 Letras / 2015 – TextoTerritório) cosmologia do impreciso (2008 – 7 Letras); língua nua (com ilustrações de Elvira Vigna 2011 – 7 Letras); lapa (2014 – TextoTerritório); manto (2015 – TextoTerritório); paixão (sobre imagens de Roberto Vieira da Cruz, 2018 – TextoTerritório)

Fez os roteiros dos filmes Urânia, poema de Alexandre Faria (com Felipe David Rodigues – 2009); Venta-não, (com Felipe David Rodrigues e Alexandre Faria – 2013). É editor da TextoTerritório.