MANTO EMINENTE – Oswaldo Martins e Arthur Bispo do Rosário – os aedos desencantadores das palavras – ou “os planos da arte”.
“a voz na falha das mãos
os lenho-laços
os fios
os planos da arte”
sianinha – Oswaldo Martins
Ao menos para mim, é muito difícil fazer da loucura objeto da poesia, aliás, mais do que isso, difícil falar da loucura, poeticamente ou não. Tudo nesse assunto é estigma, até porque quem vivenciou alguma forma de... e aqui o problema se evidencia, como chamar a “loucura”? Doença mental, alienação? E seu sujeito, doido? Ou, carinhosamente, que por vezes é possível, principalmente nas lembranças mais remotas da infância, doidinho?
Melhor nomeá-lo assim do que apedrejá-lo ou dele rir, ou cuspir-lhe a face transtornada, pois a loucura nada tem de lírica, muito menos de divertida, ao contrário, ela dói, rasga de angústia seu portador e os que com ele convivem, pois a sociedade, se melhorou no trato com ele, foi muito pouco, e ainda está presente em nós, navega no nosso preconceito, a “Nau dos Insensatos”, o escondê-lo na vergonha dos segredos da família, medo talvez de que sobre nós recaia o fatal estigma, como certa vez arrisquei: “No fundo das grutas, esperando adormecerem / os filhos e os vizinhos, para saírem pelos fundos. / Como a nudez, é melhor escondê-los nas serras / de Barbacena, ouro podre do limite das grutas”.
É o medo de um estigma infelizmente ainda presente, pois quem, como dizia e as palavras me fizeram desviar, conviveu com alguma forma de loucura sabe como é tênue a membrana que separa a doença de uma suposta, e apenas suposta, “normalidade”, citoplasma mental.
Mas toda sinonímia é precária, senão impossível. Qual a abordagem possível da loucura, se mesmo a abordagem “científica”, médica, ainda padece de irremediáveis precariedade e desconhecimento, salvo, aberta e honestamente, confessar esses mesmos desconhecimento e precariedade?
Talvez a poesia seja a única forma possível, pois permite a desconstrução, permite a (in) significação, o (não)significado, o desprezo ao significante, a partir do estigma / enigma onde o encarceram.
Como reconstruir a linguagem dos loucos? E o chamemos assim, por estranho que pareça, pois ainda acho “louco” a palavra de menor força estigmatizante. Como nos aproximar de sua sintaxe, que sintaxe é essa e como se recria no nada?