sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Rachel Jardim - sobre o lapa

Rio, 22.7.90

Oswaldo,

A sua Lapa deixa uma sensação sombria, viscosa, abafada, mas ao mesmo tempo luminosa. Há no trato uma forma nova de intimismo e uma forma nova de lirismo. Apesar do esperma, da saliva, dos dejetos, um profundo bom gosto e um grande refinamento. Não é a Lapa sentimental de Manuel Bandeira mas não deixa de ser uma Lapa emocionada, apesar da contenção. De um erotismo que sai dos quartos para a rua e perpassa tudo, até os objetos da Cavé.
Linguagem muito apurada, palavras exatas, jamais banais. Nenhum pernosticismo, apesar do apuro.
É um livro para ser lido inteiro. Primeiro de uma vez só, depois detendo-se em alguns poemas, observando a linguagem.
Gostei muito da inclusão do bidê no texto. Nunca vi um quadro de uma mulher sentada num bidê Por quê?
Fica a esperar novos poemas seus.


Um abraço,
Rachel 

quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

em vias de

oca

os seguranças fecham
as portas de ferro

as luzes se apagam
é cedo

se aproxima a horda
que comigo disputará
este pedaço de chão

t.v

o frango roda bonito
como uma galinha assada

olho cúpido
como se um cão sarnento

tia

de minha janela
olho o pau dos caras

nem sequer pra puta
a sina me deixou

andejo

sobre o catre de asfalto
a luz se aproxima

quando ela bem chaplin

a boca se abre
eu,  ex engolidor de lua


(oswaldo martins)

lapa em primeira versão




segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Charge do Jaguar


Adoniran Barbosa - Programa Ensaio 1972 Maravilha pura

Canção do não tempo de lua - Mário Lago

Canção do não tempo de lua

Amada não me censure, se sou de pouco falar
Nem se esse pouco que falo não faz você suspirar
É tempo de vida feia, de se morrer ou matar
De sonho cortado ao meio, de voz sem poder gritar
De pão que pra nós não chega, de noite sem se acabar
Por isso não me censure, se sou de pouco falar

Criança é bonito? É
Mulher é bonito? É
A lua é bonito? É
A rosa é bonito? É
Mas criança chega a homem se a bomba quiser
A mulher só tem seu homem se a bomba quiser
Homem sonha e faz seu sonho se a bomba quiser
Não é tempo de ver lua nem tirar rosa do pé

Amada minha não chore se nunca falo de amor
Nem se meu beijo é salgado, que é beijo chorado em dor
É tempo de vida triste, de olhar o seu com pavor
De mão pro último gesto, de olhar pra última flor
De verde que era esperança trazer desgraça na cor
Por isso amada não chore se nunca falo de amor

Criança é bonito? É
Mulher é bonito? É
A Lua é bonito? É
A rosa é bonito? É
Mas criança chega a homem se a bomba quiser
A mulher só tem seu homem se a bomba quiser
Homem sonha e faz seu sonho se a bomba quiser
Não é tempo de ver lua nem tirar rosa do pé

Amada não vá embora se eu trouxe desilusão
Se aumento sua tristeza, tão triste a minha canção
É tempo de fazer tempo, de pegar tempo na mão
De gente vindo no tempo em passeata ou procissão
No mesmo passo de sonho pra bomba dizendo ?não!?
Amada não vá embora, mudou a minha canção!

Criança é bonito? É
Mulher é bonito? É
A lua é bonito? É
A rosa é bonito? É
Pois criança vai ser homem porque a gente quer
A mulher vai ter seu homem porque a gente quer
Homem vai fazer seu sonho porque a gente quer
Vai ser tempo de ver lua e tirar rosa do pé


(Mário Lago) 

sábado, 17 de janeiro de 2015

Dos poemas de Tomaz Salamun

Me cansé

Me cansé de la imagen de mi tribu
y emigré.

Con largos clavos
me sueldo los miembros del cuerpo nuevo.
De trapos viejos serán las entrañas.
La pútrida capa de la carroña
será la capa de mi soledad.
Me extraigo el ojo desde lo profundo del pantano.
Con las planchas carcomidas del asco
levantaré mi barraca.

Mi mundo será un mundo de bordes agudos.
Cruel y eterno.


Dios

Yo
exijo
amor
incondicional
y
libertad
absoluta.
Por eso
soy
terrible.



Tomaz Salamun

sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Ceará 2

1

Fala

O cearense fala manso, é quase feminina sua voz cantada, que contrasta com a história das ferocidades descritas por vasta literatura.

2

Liara

Não sei que é. A exposição que assisti ontem não diz muito sobre a artista, mas as obras que tematizam o Cego Aderaldo são belíssimas, mesmo pungentes. Liara ultrapassa os limites da simples representação realista e o faz com um estilo delicado e quase teórico.

3

Francisco

Terminei a leitura do Meu irmão alemão – nem ruim de todo, nem de todo bom. Agora vejamos o Judas do Amós OZ.

4

Raja

“Uma jarra de suco de laranja, por favor”.
“Uma raja”?

Celebração linguística.

5

Caipirinha do jegue

xoxota
raspadinha
espanhola
capeta

pina colada
caipirinha
caipirosca
ula ula

(oswaldo martins)

Ceará






quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Pilulinha musical

O que pode uma voz cansada fazer com a sensibilidade da gente?

Beleza, beleza, beleza.  E essas mulheres todas! Maria, Odete, Esmeralda, Doralice, Marina, Amélia, Luciana, Emília, Celina, Helena e Laura! Como uma lembrança do que a música tem de mais pungente e simples. Nossas lembranças se fincam e se alargam para além do horizonte da mocidade, alheias ao tempo porque nele inseridas, elas emergem do fundo sem fundo do resgate do tempo, entre a voz de um e o violão de outro. Carlos José e Luiz Cláudio Ramos nos deram um presente e tanto, neste Musas das Canções.


(oswaldo martins)

Rumi

Tu, que recebes o nascimento e portas os mistérios,
teu vozerio-de-trovão nos faz perfeitamente felizes.

 Ruge, oh leão do meu coração,
e dilacera-me o corpo inteiro!


(Tradução de Lucas Haas Cordeiro)

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

Capítulo dois – Recolhas do caga-teses:

1 – Se o aqui e agora é apenas uma aparência, posso inventar a essência do mundo, como eu queira.
2 – A proximidade dos tolos faz bem ao ego dos tolos que não se sabem tolos.
3 – Minha linha dá mais corda quanto mais corda dá a linha.
4 – Tu quoque, Brute , filii mei; veni, vidi, vici; quo vadis; dura lex sed lex; ecce homo et cetera.
5 – Os índios do Xingu são os maus-selvagens.
6 – 50 anos em 5; varre, varre, vassourinha; República Nova; café com leite e bananas para quem quiser.
7 – Subi no muro! Caí de costa! TRUCO SEU BOSTA! Da escola do Truco, eu sou Doutorado.
8 – Doutor de fraque e cartola, doutor de báculo e estola.
9 – Se puta na cama, puta na rua.
10 – Farinha pouca, meu pirão primeiro.
11 – Pai, filho e espírito santo!
12 – Papai, fodeu!


(oswaldo martins)