Piedade
Quando cheguei em Piedade, Piedade tinha dois cinemas no
largo do lado da linha férrea em que fica/va
a Gama Filho. Um já estava fechado o outro que ficava ao lado do posto
de gasolina na rua da Capela fechou e reabriu.
Em dias de semana ia lá à noite. O cinema fechado tinha uma bilheteria
externa que me lembrava filmes de caubói, porque tinha uma baia como aquelas em
que os caubóis amarravam os cavalos. Fiz esta mesma associação há alguns anos
atrás, ao entrar na plataforma da estação de trens em Coimbra, em Portugal.
Senti-me um caubói.
Servia-me mais, burramente, desse lado da
linha férrea do que do lado em que
morava para me locomover de Piedade para
outros lugares. Na Avenida Suburbana,
hoje Dom Helder Câmara, muito mais farta em transporte, havia o Ridan, o
Abolição que tinha uma entrada como o Imperator, no Méier. Na rua da Abolição tinha o cine Bandeirantes.
Anos mais adiante também tivemos o Bruni Piedade, mais confortável, mas ainda
sem ar condicionado. Salvo engano, o Bruni só baixou por aqui quando os cinemas
deste lado já estavam fechados. Mas antes dele tivemos o cine Brasília, com ar condicionado,
cortinas com cheiro de tabaco, filmes só da Metro, um luxo. Não tinha a
arquitetura e a beleza do Santa Alice no Engenho Novo, mas já indicava o que se tornariam a salas de cinema mais
adiante. Tinha até sessões aos domingos de manhã do Tom e Jerry. Este cinema, não só ele ou não só isto, me
catapultou para além de Piedade e do Méier, onde havia o Mascote, o Paratodos,
o Art-Palácio e o Imperator e posteriormente um
Bruni. Foi no Mascote que vi
Madre Joana dos anjos e o Pagador de promessas, filmes capitais para mim.
Não sou nostálgico, a despeito do
que estou a escrever. Como ir ao Santa Alice se não há mais bonde? Onde
estacionar o carro? Temos hoje mais cinemas e de boa qualidade aqui perto, do
que tínhamos antes. Só me aborreço é que para ver filmes com que mais me
identifico tenha de ir a Botafogo.
Aos vinte anos, antes do Paissandu, eu já ia
ao cine Alvorada, no final da rua Raul Pompéia, em Copacabana. Mas já não tenho mais vinte anos.
Elesbão Ribeiro