sexta-feira, 17 de junho de 2022

até o último homem

para o cândido rolim


a caatinga afoga

abrevia o olhar

faz andas de tortura

em agonia os quem

da lenta metamorfose

tenaz e inflexível

confrontam

a terra

a secura dos ares

e o estrondar das armas

Dois poemas de Amosse Mucavele

Mafalala

 

Os sinos da munhuana estão velhos

Tocam nas enrugadas horas da esperança

Murcha, o cansaço das lembranças estampadas

nas casas de madeira e zinco

E no chão cimentado por pântanos

As rãs fazem ajuste de contas com o eco do abandono.

 


Subúrbio

 

Nas margens da cidade

as acácias são como almas adiadas a arder

na melancólica procura de um sonho

para enxugar os pés

e sei que nenhum peão restituirá os buracos

 

 

(Amosse Mucavele)

sem título

ao semear vermelhos-terra

as insígnias dos marechais

nos haveres-nação a morte

 

a ceva seca-sôfrega agrega

em decúbito dorsal os quem

da hora catingam destroços

 

na de ninguém pátria-pária

carcomida por torturadores

exumada nos rudes confins

 

da ausência os quem mortos

sem constituição ou preclara

medalha ao peito-continência

 

a treva medida em rictus ara

crava sub-lápide o epigrama

dos quem nada nação afora

quarta-feira, 8 de junho de 2022

pertencimento

na pele-sinais eram muitos os convites

entre eles havia uma pinta situada nas

curvas das estradas que levam ao rio

e suas margens

 

lentamente os sinais pisavam o chão

brincavam com as texturas da chuva

com as asperezas da ressequida rua

e tilintavam pianos

 

faziam os lábios reavivarem cantos

ao toque-frêmito das falanges asas

desciam e abriam caminhos nus

em ávida de devoração

segunda-feira, 6 de junho de 2022

ilhas de não

ali a paisagem negativa

esboça um risco

 

talvez o de uma cidade

pronta para o não-ser

 

talvez impresumível escultura

na ampla vaziez do ser

 

as ressalvas do que se nega

ao largo das palavras

 

perdem-se nas amplitudes

e o levam ao estertor da recusa

 

quarta-feira, 1 de junho de 2022

O TERCEIRO OLHO DO POEMA

O terceiro olho do poema
vê estratos invisíveis
nas sensações do poeta

O terceiro olho do poema vê a fé
na terra do poeta.
Vê mais do que o poeta vê
no cotidiano
e em seu superficial
desenrolar dos acontecimentos.

O terceiro olho do poema vê
as insígnias da alegria
e as lágrimas alquebradas da tristeza
no poeta.

(traduzido via dinamarquês por Luciano Dutra)

[DIGTETS TREDJE ØJE]

Digtets tredje øje
ser usynlige lag
i digterens sanseindtryk.

Digtets tredje øje ser
fortroligheden
i digterens land.
Det ser mere en digteren gør
i hverdagen
og i det overfladiske
handlingsforløb.

Digtets tredje øje ser
glædens løsen
og sorgens knuste tårer
hos digteren.

(traduzido do kalaallisut ao dinamarquês pelo autor)

[TAALLAP ISAASA PINGAJUATA]

Taallap isaasa pingajuata
takusarpai
taalliortup isiginngisai
aamma malugeqqajanngisai.

Taallap isaasa pingajuata
takursarpaa
taalliortup nunaani
tatigeqatigiinneq
ulluinnarni taalliortup
tappiillinngikkaluarluni
takusinnaajunnaagaa
pingaartumik qaatsiaannarluni
allamut saaqattaarnermini.

Taallap isaasa pingajuata
takusarpaa taalliortumi
nuannaarnerup qilerussaagai
aliasunnerullu qulliisa
imerlaarsineri.

(Kristian Olsen Aaju)