quarta-feira, 6 de novembro de 2019

Ossip Mandelstam


1

[Tradução de Augusto de Campos¹]

Vivemos sem sentir o chão nos pés,
A dez passos não se ouve a nossa voz.

Uma palavra a mais e o montanhez²
Do Kremlin vem: chegou a nossa vez.

Seus dedos grossos são vermes obesos.
Suas palavras caem como pesos.

Baratas, seus bigodes dão risotas;
Brilham como um espelho as suas botas.

Cercado de um magote subserviente,
Brinca de gato com essa subgente.

Um mia, outro assobia, um outro geme.
Somente ele troveja e tudo treme.

Forja decretos como ferraduras:
Nos olhos! Nos quadris! Nas dentaduras!

Frui as sentenças como framboesas.
O amigo Urso abraça suas presas.³

Notas

¹ Do livro “Poesia da Recusa” (Perspectiva, 364 páginas), de Augusto de Campos. Edição de 2011. Tradução direta do russo.

² Augusto de Campos prefere “montanhez”, no lugar de montanhês, para rimar com vez? É provável.

³ Nota de Augusto de Campos: a tradução literal desta última linha equivale a: “O largo peito do ossétio” (cidadão da Ossétia, da Geórgia, região de origem de Stálin). Variante literal: “Um abraço de Ossétia às suas presas”.

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