sob o etos hostil
das cidades
os dizeres
quando elas calam
vivem
de silêncio e pó
Oswaldo Martins. Poeta e professor de literatura. Autor dos livros desestudos, minimalhas do alheio, lucidez do oco, cosmologia do impreciso, língua nua com Elvira Vigna, lapa, manto, paixão e Antiodes, com Alexandre Faria. Editor da TextoTerritório
sob o etos hostil
das cidades
os dizeres
quando elas calam
vivem
de silêncio e pó
a tarde morna
me diz teu calor
olor e flor
memória sem fado
ato a nosso fato
essa face orna
(Cláudio Leitão)
1
vermes rentes às paredes
sabem-se a ser do homem
a medida única
2
nestes ossos expostos
um edifício ruinoso
habita-os
3
um pedaço de pano
em roxo sujo no interior
do horto
4
não se fazem jardins
apenas o que há
sem disfarce algum
5
as entranhas à mostra
esse vermelho parque
devoram
6
a lavra cava veias
na sórdida solidez
dos homens
para eugênia abrahão
as mãos
os braços mais tarde
os pés as desarticuladas unhas
o estrondo cava esta imagem dura
meus olhos
o espanto das ruínas
o ignóbil voejar das moscas
ser este menino estraçalhado
a nuvem de vergonha que o cobre
um retrato que desce aos escombros
de gaza
estrugir tem origem desconhecida
o homem quando a ele se aferra
atordoado pelo voo dos objetos
em descontrole
tange as possibilidades nulas
os poros se abrem
à dilação do tempo
o mínimo instaura
sua postura tátil no inútil
do quando ele usufrui
dos prazeres o átimo
de si mesmo
se deus criou o mundo
e cronos retirou-o do caos
o poema acenderá
todas as dúvidas
em sua similitude
... na primavera cidôneos
marmeleiros – banhando-se das correntes
dos rios, onde há das Virgens
jardim inviolável – e os brotinhos de vinhas –
crescendo sob sombreados ramos de
parreiras – florescem. Mas para mim a paixão
não repousa em nenhuma estação.
E, com raios marcando o caminho
o trácio Bóreas,
voando veloz da casa de Cípris, com crestantes
loucuras, sombrio, descarado,
com mão firme, desde o fundo,
vigia meus sensos...
(Frag 286 Íbico)
o conceito em sua inutilidade
arredonda o corpo do poema
no espaço erode os objetos
as ações e – relâmpago vivo –
por serem móveis as palavras
que o secretam se derretem
as possíveis tramas fazem
rasas
as passagens que se mostram
e desaparecem
hetaira
afronta desde as águas
o himeneu a cantora
de fados e fodas
*
farmácia
circense margarida
dos homens canta
a pobre ilusão
*
tauromaquia
enquanto hera vigia
o tapete borda helena
símile divino