segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012

Pilulinha 20


O Livro de Praga, de Sérgio Sant’Anna, escrito para a Cia das Letras, é constituído por uma economia verbal rigorosa. Nos contos em que se passeia por Praga – intencionalmente, o autor visita, além dos ícones da cidade, uma tradição literária que sempre se quis moderna, inquieta e renovadora.

Praga – narrativas de amor e arte – é tudo isso – um visitante da boa tradição dos contos e da inovação absoluta da arte experimental. Já na primeira história – A Pianista – anuncia-se todo o refinamento e tema que Sant’Anna desenvolverá num crescente e pungente erotismo – que o digam A Tenente e O Texto Tatuado, para não falar do erotismo profundo e dilacerante de A Boneca.

O erotismo nos contos de Praga transcende a carne e se joga no corte preciso da arte indo além da perspectiva do erotismo tout court. A criação das perspectivas de se ler o que a arte e a arte de narrar podem ainda atingir leva o leitor ao cerne mesmo da indagação da leitura. Uma peculiar mímesis se opera nos contos do autor, sem que o depurado intrarrealismo[i] de Kafka se afaste do pensar ingente das impossibilidades, os contos de O Livro de Praga o visitam e sugerem a angústia do inominado.

Ao mergulhar nessa angústia não é que o erotismo se afaste para dar lugar ao metafísico, mas que num e noutro polo o erotismo se realiza fazendo do espírito também ele parte sensível dos desejos, como se pudessem ser tocados nesta agônica escrita toda a totalidade do homem despedaçado e silencioso que, entretanto, confronta a esquivança do mundo e dela toma posse.

Para o Cláudio Leitão, pela indagação


[i] Por intrarrealismo queremos dizer do realismo que nasce da perspectiva narrativa ela mesma

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