Egon Schiele. Seu erotismo era apenas
um sinônimo para ver o mundo com alegria. Na minha fase da mais aguda magreza,
gostava de me sentar com o Pretinho no colo. Demoradamente minhas mãos ao longo
de seu dorso faziam com que ele e eu ficássemos arrepiados. Meus olhos sempre
manchados de tinta escura, o peito desnudo. Era capaz de ficar assim dias inteiros,
buscando a pose adequada, sentindo a cauda entre as pernas, quente, quente.
O chapéu do início do século, que
conseguira num brechó, deixava-me com ares de pequena puta – eu, moça de 25 anos,
sabedora ainda dos poucos mistérios da vida. Com o Pretinho aprendi certas
safadezas, principalmente nas artes a que ainda não tivera acesso e que me
faria um ser completo, como usar os seios, quando o desejo de me despir se
fazia necessário e urgente.
Usei muito os seios e as mãos em
mim, nas mulheres e homens com que trepei. Para se aprender uma arte é
importante praticá-la. Se não me engano foi o nosso poeta João Cabral quem
disse sobre outro pintor –
Miró sentia a mão direita
demasiado sábia
e que de saber tanto
já não podia inventar nada.
Quis então que desaprendesse
o muito que aprendera,
a fim de reencontrar
a linha ainda fresca da esquerda.
Pois que ela não pôde, ele pôs-se
a desenhar com esta
até que, se operando,
no braço direito ele a enxerta.
A esquerda (se não se é canhoto)
é mão sem habilidade:
reaprende a cada linha,
cada instante, a recomeçar-se.
A experiência de Miró e as poses
de Egon me fizeram aprender a usar o corpo para o prazer. Era ainda jovem, e o
caminho que escolhera para vida me permitia algumas ousadias a que se chega
apenas pelo entendimento sobre as artes. Tudo para que os bobocas e as bobocas ficassem
de quatro por mim, sem saberem que o guizo lhes punha eu.
(Jurema Silva)
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