Em Agulhas Descartáveis, livro de Luiz Coelho, editado
pela Oito e meio, encontram-se algumas boas soluções para a formulação do
poético, outras nem tanto. Parece-me, ao
contrário do que o prefácio diz, um livro irregular e de certa forma imaturo; o
que não significa dizer que seja um livro ruim.
A poesia contemporânea
parece ter pressa, os poetas querem se ver logo publicados, com ironia,
poder-se-ia dizer que se acham todos um Rimbaud; mesmo antes de afiarem a faca
da linguagem, tornarem-na plena, preferem as aspas das tesoura que revelam não
a lâmina afiada da lâmina cabralina, mas a possibilidade de mascar. Ou mesmo,
antes de alucinarem a linguagem nas
experiências das poéticas alheias, preferem a alucinação mais fácil do verso
forçado, porque ligada diretamente à
vida – se posso repetir a ironia – acham-se todos um Whitman. Não sei se seria
o caso de guardarem sua produção, de fazerem cortes, de evitarem algumas
facilidades como a que o poeta comete no verso “por espremidas, meio que mal
exprimidas” . Lembro-me ao ler os versos
acima de comentário feito por – se não me engano – Mário de Andrade, quando
saúda o aparecimento de Vinícius de Moraes, poeta novo – que publica pela
primeira vez perto dos dezoito anos – e critica o verso francamente ruim do “que
passa e fica, que pacifica”.
Embora seja
feita essa ressalva, há poemas de força marcante, como a série de hai-kais e
friagem. Este poema é, a meu ver, uma das sínteses mais curiosa e bela do que a
literatura de viagem vem produzindo ao longo de toda a tradição poética
ocidental – sem que queira abarcar a completude do mundo, como intentaram diversos
poetas. A síntese buscada confronta os grandes esquemas interpretativos do
mundo e delineia um gostosíssimo tom menor nesta viagem à intimidade sugerida.
Friagem possui dois quartetos que são ligados por um
elemento de passagem representado por um dístico, revelador – na linguagem – dos
sentidos que transformam a narratividade numa intimidade lírica. O comentário
extrapola a grandiosidade do épico com que se inicia o poema na narratividade anunciada
do “quando eu voltar” e ao usar
habilmente a cena contígua “enquanto isso” de sabor rotineiro anuncia um
vocativo, Penélope, que transtornará a
receptividade insinuado do narrativo mergulhando o poema nas forças da lírica,
indicada pela presença de um imperativo que joga a cena poética no só no tecido
lírico mas na intimidade que volta anuncia.
Quando a poesia
atinge um grau de expressividade tão elevada, deveria o poeta ater-se a ela e
com ela descobrir os caminhos que sua construção exige e de que a poesia de
nossa época anda carecendo.
(Oswaldo Martins)
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