domingo, 12 de agosto de 2012

Liberdade


Liberdade

Nos meus cadernos de estudante
Na escrivaninha e nas árvores
Na areia nevada
Escrevo o teu nome

Nas páginas lidas
Em todas as páginas brancas
Pedra sangue papel ou cinza
Escrevo o teu nome

Nas imagens douradas
Nas armas dos guerreiros
Na coroa dos reis
Escrevo o teu nome

Na selva e no deserto
Nos ninhos entre as giestas
No eco da minha infância
Escrevo o teu nome

Nos meus trapos de caloiro
No açude de sol bafiento
No lago de lua esperta
Escrevo o teu nome

Nos campos no horizonte
Nas asas dos passarinhos
No moinho tenebroso
Escrevo o teu nome

Em cada sopro da manhã
No mar e nos navios
Na insensata montanha
Escrevo o teu nome

Na espuma das nuvens
E nos suores da borrasca
Na chuva densa e insípida
Escrevo o teu nome

Nas formas cintilantes
Nas cores dos sinos
Na verdade física
Escrevo o teu nome

Nos caminhos conscientes
Nas estradas estendidas
Nas praças que trasbordam
Escrevo o teu nome

Na lâmpada que se acende
E naquela que se apaga
Nas minhas razões reunidas
Escrevo o teu nome

No fruto cortado em dois
Do espelho e do meu quarto
Na cama concha vazia
Escrevo o teu nome

No meu cão glutão e terno
De orelhas levantadas
Na sua pata desastrada
Escrevo o teu nome

No limiar da minha porta
Nos objetos familiares
No rolo de fogo sagrado
Escrevo o teu nome

Em toda carne acordada
Na testa dos meus amigos
Em cada mão que se estende
Escrevo o teu nome

Na janela de surpresas
E nos lábios comoventes
Mais longe que o silêncio
Escrevo o teu nome

Nos refúgios destruídos
Nos meus faróis extintos
Nos muros do meu tédio
Escrevo o teu nome

Na vacuidade sem desejo
Na desnuda solidão
Nas escadas da morte
Escrevo o teu nome

Na saúde reencontrada
No risco extraviado
Na fé sem recordação
Escrevo o teu nome

E pelo poder duma palavra
Recomeço a minha vida
Nasci para te conhecer
Para te nomear.

Paul Eluard
in Poésies et vérités, 1942

Nenhum comentário:

Postar um comentário