para lula
1
O cotovelo deitado sobre a escada
em Montmartre se construía sob o impacto de quem nunca pousara seus olhos na paisagem
das velhas putas. O gínglimo – este artefato inumano – com seus graxos, possuía
a percepção de um pequeno traço, pontudo. Quase uma seta ardente no momento
fugaz da unidade. Apontava nortes exatos, na bailarina exausta desta dobra particular
do tempo, como se apontasse para dentro de si mesma. E em uma imagem invertida
a rua que se desdobrava abaixo era um reflexo dos peitos murchos de uma vadia
ou eram os peitos deitados sobre as ruas a medida milimétrica da tradição aproveitada
pelas cores que aqui e ali pareciam um corte no supercílio, um pedaço de
músculo, o olho cego exposto por todos corpos torturados nos porões da gendarmaria,
da KGB, da CIA, da polícia brasileira Os corpos dos cubanos, dos negros, dos
argelinos, das meninas de programa, reunidos neste cotovelo anverso.
2
JM nunca esteve em Montmartre.
Olhava a cidade de cima. O presente. O tapa na cara. A boceta nua e o cotovelo
de deus. Fora apenas pequenos excertos de um coubert, o realismo pouco lhe interessava,
preferia as noites estreladas, o joelho de Tarsila, as máscaras do Benin. A
gramática exposta nas entranhas dos corpos esquartejados nos mais diversos
substratos. Madeira, tela, pedaço de pano, refugos. Não subira as escadas, não
visitara a Sacre-coeur, preferira apontar para os ícones, construir proximidades
nada espontâneas, forçadas, pois acreditava que a forja da resistência era construída
das derrisões, da destruição das casas apalacetadas que a arte compunha
comprometida com o esgar burguês da fotografia e da representação das democracias
ocidentais. JM preferia os cotovelos de uma democracia anárquica.
3
O flash o estampido a inexistência
da vírgula do ponto dois travessão uma linguagem vertida vômito frêmito, embora
a razão sobrevoasse todo demão de tinta, colada aos poros em uma obsessiva busca
de anatomias escondidas em que o beco e não a glória sobressaísse, denominasse
pelo nome mais exato este cotovelo repousado sobre a escadaria de Montmartre.
4
Todo equívoco nasceu quando imbuído
das tenebrosas interdições a que nossos pintores, nossos escritores se
prenderam. Dai este pedaço escuso, essa absurda alegoria de outro deus.
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