sábado, 21 de maio de 2016

antiode para madames e mordomos

para horácio matela

as moças que saem de casa
as moças que se postam nos bares da cidade
nas ruas cearás
que antes beberam no mangue
e foram do beliscão e da piscadela senhoras
enfrentaram os vidigais
os madrigais eloquentes do senhor poeta casimiro de abreu
os lufa-lufa dos passeios públicos

as moças que nas glórias
as moças que nas avenidas copacabanas
nos inferninhos
desfilam peitos e bundas e coxas e a cabeleira revolta
que lhes esconde a barba incipiente

as que se dão aos beijos no meio dos concertos
as que se dão ao amasso nas poltronas nos divãs
as que se dão revoltosas e lúgubres nos mercados
as que se dão macias e tesas da própria femeeza
e se lambem inteiras e gozam libertas

belas, essas moças
impedem que se lhes chamem senhoras
impedem que se lhes chamem madamas
impedem que se lhes chamem recatadas

pois a faca que usam é peixeira
pois a faca que usam sabe a navalha
pois a faca que usam
afasta de si os talheres de prata
a faca de mesa
a faca abastada com que se vendem
as mulheres do lar

para os senhores de baraço e cutelo
para os industriais e seus capachos
para os coronéis e seus jagunços
que as vampirizam
que as mortificam

com as duras leis da obediência
com as canalhas de seda
com a improbidade
dos golpes

e o charuto dos que se pensam acesos
e necessitam – ó usurpadores,
da libido do poder
da libido dos revolveres
e dos altos cargos

para, então, se porem sobre a mesa
 e depositarem na carne dos outros
as suas tristes figuras

para, então, se porem sobre a mesa
e, calhordas que são,
se regozijarem na caça
no acossamento
na delação autoimune
como uma doença que há de comer-lhes
o próprio fígado sob o fedor da podridão

(oswaldo martins)


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