A simplicidade
não é necessariamente simplória naquilo que diz. Pode, pelo contrário, atingir
um grau elevadíssimo de interpretação do mundo. A ciranda, manifestação
cultural do nordeste brasileiro, tem essa característica ímpar, quando se dá na
voz de Lia de Itamaracá. Na reflexão sobre a passagem dos anos, a presença do
desejo, para além do tempo, se aplica na afirmação de que agora, com a idade
chegada, entretanto, ainda se vive na beira do mar, quando o viver a cirandar é
o correlato do desejo imorredouro.
Outra
manifestação da simplicidade profunda está no Pastoril do Velho Faceta. Ao
interpretar o senso comum do brasileiro, as músicas que compõem o pastoril
jogam constantemente com o duplo sentido jocoso da cultura de que faz parte.
Neste sentido, O casamento da filha do Seu Faceta cria uma sociologia própria
do imaginário das relações familiares. Por trás da malícia ligeira das
admoestações do pai para filha que quer casar, revela-se a cultura terrível
destas mesmas relações. Ouvir com atenção as duplicidades do texto é mergulhar
neste universo de pavor através das revelações pretensamente despreocupadas que
a voz do Velho faceta traz. Se não, emendem o casamento com a deliciosa e
terrível música que é Bacurinha.
Estas manifestações
revelam características sutis da sociedade brasileira e nos faz entendê-la
melhor.
(oswaldo
martins)
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