quinta-feira, 22 de abril de 2010

Cachaça, Árvore e Bandeira

Cachaça, Árvore e Bandeira


Para ouvir-se a bela música feita por Moacyr Luz e Aldir Blanc, é necessário unção. A homenagem prestada a Carlos Cachaça emociona, na voz arranhada de Moacyr, nos versos de Aldir, que retomam em citações mínimas o universo musical do poeta de Mangueira. Vejam a graça indizível, como diria Vinícius, ao se referir à mulher que volta, da expressão “aurora bordadeira”, que veste o rosa do arvoredo, quando Mangueira acorda.

A música guarda ainda alguns outros achados muito bonitos. O processo metonímico em que Carlos Cachaça é ao mesmo tempo o gênio da raça, a fina flor, o mito da massa, o Embaixador, raiz, tronco, folha sagrada abre a possibilidade de verificar-se a integralidade do retrato do artista e seu alcance mágico e profundo. Deixando de ser identidade, o artista passa a entidade e empunha o que de mais precioso pode ter um país, a herança de seus mestres, de seus sábios, por isso o Sambista passa a ser dança.

No plano do simbólico, ser dança é produzir sentido para além do sentido, sabiam-no já os gregos que tinham sua expressão identitária da representação artística na dança, só que por representação artística entendiam eles a identidade da própria polis, onde o processo de integração de seus habitantes se dava a partir da rítmica que levava o corpo a integrar-se também ao cosmo. A festa dionisíaca é festa da dança, as bacantes dançam insufladas pelo ritmo frenético da música.

Ao transformar-se em dança, do artista afirma-se ser a bandeira possível e desejada que bordará, como diz Aldir Blanc, o céu estrelado de nossa bandeira pela bandeira viva dos mestres-estrela a identificar com a história de seu povo.

(oswaldo martins)

Abaixo, a letra da composição homenagem aos poetas do samba:

Gênio da raça,
Carlos Cachaça –
Dos arengueiros, a Fina Flor.

Mito da massa,
Carlos Cachaça,
Da Verde-rosa, o Embaixador.

O tempo passa
Na corredeira...
Carlos cachaça bebeu Mangueira.

Raiz e tronco,
Folha sagrada onde o morro
Reescreve a história de seu povo
__ Mas essa é verdadeira!

São os tambores
Que narram a lenda guerreira
No Quilombo da Estação Primeira!

É tão bonito
Ver um sambista transformar-se em dança
De ramos verdes onde o vento e a sombra
Transmitem aos filhos sua herança.
Quando o arvoredo amanhece
Vestindo o rosa da Aurora Bordadeira
Cada estrela troca o céu
Pela bandeira da Mangueira!

(Moacyr Luz e Aldir Blanc)

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