sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Letes


Pelas horas de ausência e de deserto
em que durmo esta vida onde me gasto,
outra mão, que com o meu dormir desperto,
vai acordar o tenebroso pasto

de que se nutre o poço em mim aberto;
então, sou mil, sou fel, sou vinho casto,
e da minha unidade me liberto,
e – asa de éter – além de mim me afasto.

Indago abismos, lúcidas alturas
leio, cravos acendo em lajes frias,
frequento-me nas praias do arrebol,

reconstruo em meu corpo arquiteturas,
naturezas, e músicas, e dias
de um país exilado atrás do sol.

(7-8.6.52)

Abgar Renault

Nenhum comentário:

Postar um comentário