ou diatribes das madrugadas de sexta-feira
todas as vezes que leio os versos de meus verdes anos, sinto uma
vontade de nélson rodrigues. as taras sobem-me à cabeça, os abusos da estupidez
se colocam tão claramente à minha frente que a vontade de ir ao túmulo do sr. casimiro se torna quase
uma obsessão física. gostaria de cuspir-lhe na tumba, na impossibilidade de
esbofeteá-lo. autor de versos tão insossos merecem não o desprezo dos leitores,
mas uma raiva fervorosa e inextinguível.
o poema das saudades da infância
bem poderia ser lido como o poema das saudades da infâmia! que outra coisa não
é essa infância retratada entre borboletas azuis, laranjais e bananeiras, bem-postas
entre as beijocas da sra. mamãe e da irmãzinha prazenteiras. sinhás de um mundo
cuja patente exploração sofre-se até hoje, não só nas dificuldades apresentadas
na vida cotidiana de exceções e privações, mas na péssima poesia que se
praticou e se pratica como edulcoração do umbigo, que por traçar versos pífios
se acha merecedora das glórias de um panteão mais podre que a canalhice a gritar
primeiro o meu.
o sr. casimiro, com versos tão óbvios,
em ritmo de surpresas nenhuma, exclamativo e pimpão, é o triste retrato de certa
poesia brasileira, dos que querem o galardão da propaganda, da ideologia fácil,
midiática e rebolante. uma poesia carmem miranda com bananas, as laranjas, as
mangas, as pitangas ditosas como os abricós. conquistado à musicalidade
predatória do bate estaca dos versos, o poema se parece àquelas ladainhas enfadonhas
que se recitam nos templos da modernidade.
o ritmo das senzalas não chegam
aos ouvidos do proto poeta como não chega aos ouvidos eruditos dos poetas proto
modernos. toda a pretensa graça das saudades (da infâmia) está no esquecimento
dos ritmos que fulguravam nos longos cantos inauditos, dos jogos de corpo, das
artimanhas da linguagem com que se forjava – na forja e no muque – a luta constante
pelo direito à voz. o sr casimiro não apenas não os escuta, mas os recalca e ao
fazer com que o leitor caia na artimanha do bate estaca introduz, com o frio
que os românticos sabiam fingir como calor tropical, uma perempta forma de
pensar o país que se estende em várias direções e faz com que se aceite a
ficção das novelas e jornais televisivos. é claro que o poeta-salsicha achava o
céu lindo e se preparava hodiernamente para rezar suas ave marias.
na impossibilidade de dar-lhe de
prancha ou de talho, ante a inutilidade de ir lhe à tumba dar uma cusparada,
resta-nos torcer para que o demônio, evocado por paulo vanzolini, capriche
neste salsicha, espetadinho no garfo.
(oswaldo martins)
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