segunda-feira, 12 de julho de 2010

língua portuguesa

1


é preciso destravar a língua

caralho
bago
coalho

desconhecer os entraves da misericórdia

e a bucetinha
como uma roda d’água

vadia


2

deixar o quê
operar milagres

usufruir soberbamente
as palavras

as sintaxes
e a sonoridade

das
que explodem

de gozo

quando gozam
os falantes

da língua portuguesa



3

língua para se usar
e destampar as conchas
os galanteios

língua para se usar
contra

sem interdição

a língua como um gineceu
aberto a experiências

uma língua-madalena
na elegância das putas

que sabem da nudez
os usos mais soberbos


4

língua madalena
não a língua
das mamães cem por cento

não a língua dos magistrados
não a dos professores em seus usos didáticos

língua sem depósito ou raiz
língua das ruas

onde se aprende da língua
o que da língua se move

e o dizer do prazer agudo
nesta língua transformada

no que a língua
deixa ver



5

talvez a buceta em flor
a beira d’água

lírica dos amantes
que extraem deste timbre

os vagidos estelares
o curso dos rios

a preparação dos moinhos
e a vida repovoada


6

talvez a densidade

talvez o desenlace
o próprio sobrevôo

sobre as palavras
que estouram

e tabulam
o manancial dos ritos



7
para joão ângelo oliva neto

como um totem
esta pica

come os tabus

para que o renovado
deus da priapéia

erija monumentos
nos jardins públicos

nos privados banhos
de casa

na exposta língua
dos prostíbulos



(oswaldo martins)

Um comentário:

  1. Excelente, Oswaldo! Era preciso ecoa um quê dos modernistas - a língua das ruas, a língua do povo que vai fazendoi seus telhados (não temos como negar, né?) mas avança! Envereda por uma língua que é própria , do poeta Oswaldo Martins, mas que não se recusa ao coletivo, ao ecoar antiodes, por exemplo.
    E mais "Buceta em flor/à beira d'água" - nada melhor para traduzir e atualizar a "última flor do Lácio". Parabéns, cara!

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