quinta-feira, 30 de abril de 2015

paraná

batam os tambores no haiti
batuquem os surdos nos morros
os atabaques baianos

os vodus da jamaica
afiem suas facas
de hefesto

que o espírito de hácate
as erínias – cadelas da raiva –
rasguem a pele do infausto

comam o coração de pústulas pleno
e o joguem-no aos porcos devoradores
e do resto do corpo façam um judas

para malhá-lo-lo até que se salguem
a terra dos palácios e com o sangue
dos homens garroteados pela luta

erijam de hades o reino absoluto
para os pulhas


(oswaldo martins)

quinta-feira, 23 de abril de 2015

Os bundas de Eugênio Hirsch



O bunda Alemão,
O bunda Italiano
O bunda espanhol

Os saraus e as bibliotecas

É lamentável a redução de horário de funcionamento das Bibliotecas Parque do Estado do Rio. A desocupação começa por aí. A outra ocupação continua por aí. A repressão, os achaques e os assassinatos perpetrados pelo estado continuam. Nada de novo no front. É pela cassação aos direitos de educação, cultura e lazer que começam os apertos das vacas magras. Por que manter abertos, em horários alternativos aos da exploração do trabalho, aparelhos de formação, informação e transformação? Melhor deixar os pobres, "quase sempre pretos", sob a mira podre dos fuzis e das ideias que facilmente os assimilam como marginais, baderneiros, ladrões. Parece que isso é para justificar matá-los com tiro. Salvar a propriedade que os livros e a cultura podem ameaçar.
O curioso é que a ideia original era tirar das mãos do Estado, onde o projeto não garantiria continuidade nas sucessões de governos, e entregar ao terceiro setor, para que Organizações Sociais pudessem ter mais liberdade de captar, administrar e manter acesa a chama transformadora das bibliotecas. Faço minha a pergunta de Sergio Bianchi, "quanto vale ou é por quilo?". Para onde irão, na hora das vacas magras, os colaboradores de projetos bica aberta tão paradoxalmente condoídos e esperançosos com a criatividade das gambiarras pão com ovo?
Lembro bem (e agora a coincidência de ideias vem a calhar) que uma das primeiras ações do Sarau Manguinhos (na época, Sarau Poético de Manguinhos) naquela Biblioteca Parque foi o velório de Machado de Assis. Uma leitura, à luz de velas, de trechos sobre o tema da afrodescendência retirados da obra do bruxo. Na entrada do velório projetávamos as cenas iniciais do filme de Bianchi ao som do conto "Pai contra mãe".
Agora com a redução dos horários, para trabalhador não usar, para estudante do vespertino não usar, continuamos velando (e embranquecendo) Machado de Assis.
O Sarau Manguinhos continua vivo porque preexiste à ocupação da Biblioteca. Já ocupávamos o território com cultura e poesia, antes do Estado.
Os movimentos populares continuarão crescendo no Brasil. E com eles consciência de que é possível mudar a realidade que passa no repórter esso.

(Alexandre Faria)

Convite


terça-feira, 14 de abril de 2015

poemas do mal-dizer


1
por quem os sinos dobram

o traço curto da sobrepeliz
se entoa hinos a deus
com o couro de gato
bebe água do chafariz

2
pároco de aldeia

o padre de pescoço duro
quer a virgem no alto do altar
a moça se oferece coitado
sentada no genuflexório

3
portugal
para o elesbão

eram duas irmãzinhas e um irmãozinho
eram três irmãozinhos muito coitados
queriam as bênçãos da santa madre
e lhes empurraram dom sebastião
e de quebra o puto do salazar

4
cônego

o cônego d casmurro
dizia que se bem tocados

bidê de prostituta
chave de cafetina
e castelo de assepsia

mais valiam que
a bandeira do divino

5
beata

maria tabaqueira cuspia grosso
na rua
na missa
apenas papava coisa fina

(oswaldo martins)





sábado, 11 de abril de 2015

o poema das mulheres tortas

as mulheres tortas especam o espírito da beleza
como se com elas a piedade não valesse
como se com elas a pietá fosse apenas
o ardor de trepar com a mãe de cristo

as mulheres com grelos-chave quando ativam
no foder bem fundo a cona os não cerúleos
freudianos do histerismo dos cristianos
sacrossantos sibilam a foda ela mesma

as mulheres tortas são as garrinchas da cama
driblam como ninguém e corcovam no meter
a esperança dos homens na ânsia gabiroba
da febre especular do já gozaste, putinha

as mulheres tortas são como na rua a multidão
a mandar à merda os bolsonaros os stradivarius
da elite coxo-musical da nacionalidade em triste
bastão a meio pau quando se vê de pau em riste

para o Capilé


(oswaldo martins)

sexta-feira, 10 de abril de 2015

Pilulinha 43

Dante Milano, poeta da contra dicção, tem sido negligenciado nos estudas dos críticos brasileiros, talvez por dois motivos. Um pelo caráter contra-dictórico de seus poemas. O outro pelo desdobramento que esse contra-dictório tem na percepção do poético.

Ao contrário de Trakl, que faz uma poesia do mundo fechado, o poeta brasileiro usa palavras e sintaxes palmares, passíveis de serem entendidas, em sua superfície, pelo mais tosco entre os toscos político do país. O misto de entendimento e contra dicção faz de Milano o poeta brasileiro mais irredutível ao aparelhamento dos média.

No seu poema Pietá, a dor da mãe, que poderia se identificar com o lugar comum do leitor, é jogada para longe, quando se afirma na sua intransitividade, na incapacidade de dividir com o outro o que lhe é próprio, a dor. Anti-romântico por excelência, o poema, ao fazer a mulher olhar para baixo, faz com que ela veja apenas o que o filho é em seu presente momento de cadáver. Nenhuma contemplação, nenhuma dúvida; o olhar que olha vê apenas o que pode olhar, a afirmação do humano em sua finitude.

Qual mídia usaria essa força, essa trágica percepção e a aproveitaria para fazer o poema se submeter aos seus desejos de venda e compra? Ao se tornar irredutível à propaganda, o poema de Dante Milano afirma o lugar exato que a poesia deve ocupar.


(Oswaldo Martins)

Parsifal, a letra

Morreu lá em Paciência, hoje deu no jornal
de velha insuficiência da supra-renal
Na mais completa indigência, o major Parsifal

Homem de grande sapiência e alto valor moral
Clerical, radical, racional, marcial
Desempenhou alta incumbência na revolução
Foi durão, lei do cão, repressão, pescoção
Depois foi ser da presidência de uma estatal
federal, capital, nacional, integral

Nessa estatal é que a Filó, passista da Mangueira
Botava fogo no paiol, reinando de copeira

E, foi assim, que o Parsifal, em plena ditadura
de forma lenta e gradual, entrou pela abertura

Pois acontece que a Filó não era mole não
Avião, combustão, explosão, um vulcão
Jóias, viagens, mordomias, compras no cartão
Um milhão, um bilhão
E a paixão não diz não

Homem de grande sapiência e alto valor moral
O major Parsifal se deu mal:
Hospital, funeral...
Deu hoje no jornal.

Mas o pior é que a Filó me ligou de Miami
Ficou sabendo que o "Fal" tinha tido um derrame
E ao ouvir a fatal conclusão
Inda indagou de pecúlio e pensão
E deu um puta faniquito quando eu lhe contei
Que o Seu Major tinha morrido lá em Paciência
Daquela velha e mal-curada insuficiência
Ele que foi ferrabrás costumaz
Que comandou umas dez estatais
Morreu com u'a mão na frente e outra mão lá atrás

Parsifal - Guinga (Part. Chico Buarque e Nei Lopes - Álbum "Suíte Leopol...

terça-feira, 7 de abril de 2015

Suspiros

a vizinha que mora na casa em frente a casa em que moro
estava há pouco a falar ao telefone
não se ouvia outra voz
só podia estar ao telefone

quando o casal da casa vizinha estiver a discutir
sem que as vozes se entrecruzem 
sem que as falas se misturem
sem que se ponham aos berros
não te preocupes
hão de estar a comer 
sentados no sofá  e a ver a novela

ah Bernard disse a vizinha

amanhã vou saber
se lhe morreu o neto
ou se lhe acometeu um suspiro

elesbão ribeiro
04/03/15